Quais são os parâmetros que devem ser utilizados pelo magistrado na apreciação de uma medida cautelar pessoal?

1 INTRODUÇÃO

A persecução penal carece de evidente problematização quando da noção de cautelaridade compreendida nas decisões proferidas pelo Estado-Judiciário. A cultura do cárcere, intimamente presente na atividade jurisdicional brasileira, é evidenciada pelo crescente número de prisões preventivas decretadas em desfavor dos acusados da prática delituosa, um dos fatores para o afastamento das garantias constitucionais do sujeito e, por conseguinte, da superlotação das unidades prisionais.

Considerando, ainda, as inovações pretendidas pela Lei n.º 12.403, de 4 de maio de 2011, que projetou nova sistematização para a decretação de medidas cautelares, o número de prisões preventivas no Brasil persiste em vertiginoso crescimento, pois, na falta de uma análise pormenorizada da real adequação e necessidade das medidas cautelares, o encarceramento provisório persiste como válvula de escape ao problema político da criminalidade.

Essa ideia resta totalmente desvinculada do processo penal erigido em base democrática, porquanto promulgada a Constituição da República de 1988, cuja sistemática principiológica efetiva o processo como garantia de direitos fundamentais. Aliás, a concepção de Estado Democrático de Direito atualizada pela recente Teoria do Estado e da Ciência Política traz a identificação do marco de sua construção a partir de um processo que se desvincule do autoritarismo e identifique a pessoa humana como sujeito de direitos e titular do poder, exercido por meio das funções estatais e seus respectivos órgãos.

Nesse sentido, a audiência de apresentação – ou de custódia, como amplamente conhecida, debatida e efetivamente implementada pelo Conselho Nacional de Justiça em parceria com o Ministério da Justiça e o Tribunal de Justiça de São Paulo, em fevereiro de 2015, tem o fito de justificar a conversão da prisão em flagrante de delito em prisão preventiva somente após o devido debate acerca de sua necessidade, segundo entendimento de que a pessoa autuada tem o direito de ser apresentada diante de um juízo competente, em prazo razoável, para assim deliberar sobre a decretação de sua prisão.

Não custa salientar, ainda nessas linhas introdutórias, que tal movimento em decidir pela necessidade e adequação da prisão preventiva jamais será entendido como exercício burocrático da jurisdição estatal, ou seja, exercido exclusivamente pelo juízo competente materializado na figura do julgador, mas bosquejado com base na intensa participação do acusado, dos demais interessados e constituidores dos órgãos de acusação e de defesa técnica.

No presente trabalho, será adotado o termo audiência de apresentação, e não audiência de custódia, por firmar-se como a expressão mais técnica e constitucionalmente adequada aos objetivos do instituto a ser estudado.

Por fim, esse artigo encontra-se organizado em três capítulos, dos quais há de se destacar, respectivamente: a noção de tutela provisória mais próxima e aplicável ao Direito Processual Penal e seus institutos, considerando a garantia constitucional da presunção de inocência; o estudo sobre a prisão preventiva no Brasil, a partir de substrato jurídico que represente a atual aplicação do instituto; e, por fim, o aperfeiçoamento do sistema processual a partir da audiência de apresentação.

2 A TUTELA CAUTELAR NO DIREITO PROCESSUAL: CONSIDERAÇÕES ELEMENTARES

Em sua Teoria Geral do Processo, Rosemiro Pereira Leal (2014, p. 169) expressa algumas diferenciações entre o Processo de Conhecimento, o Processo de Execução e o Processo Cautelar. Para o referido autor, o Processo Cautelar constitui-se procedimento auxiliar, “de modo preventivo, preparatório ou incidental”, que geralmente é instaurado para “assegurar os efeitos de uma futura sentença ou de sentença já expendida o a efetividade de procedimento em tramitação ou a ser instaurado”.

É importante notar, quaisquer sejam as suas manifestações, que o Processo Cautelar envolve-se diretamente com o poder geral de cautela do juízo ou mesmo um dever legal para a aplicação dos institutos do procedimento cautelar, no tocante ao momento em que se manifestam. Ao passo que as medidas cautelares são incidentais, ou seja, observadas no decorrer da tramitação de um processo de conhecimento, em sua fase ou de execução, o processo cautelar é autônomo, com caráter igualmente provisório, dotado de alguma satisfatividade (BARROS; MACHADO, 2011, p. 13).

O então Processo Cautelar, hoje reorganizado nas disposições da Tutela Provisória, tem por fundamento, em sua teoria antes da vigência do Novo Código de Processo Civil, uma decisão baseada na sumariedade da cognição, “conferida à base de juízos de verossimilhança” (ZAVASCKI, 1997, p. 30) pelo dado de sua urgência, mas que também supõe os seguintes pressupostos, segundo Ovídio Baptista da Silva (2001, p. 76, 80, 81, 86, 92 e 93): iminência de dano irreparável, demarcado por aquilo que a doutrina identifica por periculum in mora e fumus boni iuris, ou seja, o perigo da demora em se atingir determinada tutela jurisdicional e a existência de um direito provável; a temporariedade da decisão cautelar, pois persiste enquanto perdurar a situação de perigo, o que torna possível a revisitação da decisão provisória; a situação cautelanda, “objetivamente identificável com um direito subjetivo, uma pretensão, ou ação, ou mesmo uma eventual exceção da parte que postula”, de modo a vislumbrar o manejo cautelar; e, por fim, uma sentença mandamental capaz de originar um pronunciamento estatal que, ao mesmo tempo, seja jurisdicional e sem força de decisão definitiva (não-satisfativa).

Não por menos, o Novo Código de Processo Civil desenhou contextualizada sistemática aos institutos próprios da cautelaridade, designando por Tutela Provisória (e não Processo Cautelar) os criados dispositivos sobre a Tutela de Urgência e da Tutela de Evidência. Em análise técnica, o Processo Cautelar não fora extirpado do Novo Código de Processo Civil, ainda que inexistente um livro específico para o exercício das cautelares nominadas, mas os institutos próprios da cautelaridade foram mantidos, com a unificação de alguns pressupostos, criação de outros ainda mais específicos e nova dimensão no momento de sua aplicação.[2]

Contudo, manteve-se a ideia de provisoriedade, relacionada justamente com a natureza da jurisdição cautelar, como bem salienta Ovídio Baptista da Silva (2001, p. 37), pela inexistência de uma decisão definitiva no momento de sua incidência, capaz de resolver a lide com julgamento de mérito por inexistir produção de coisa julgada material – sua natureza é provisória, sem resolução das questões deduzidas em pretensão pelo autor e resistidas pelo réu (lide).

Sobre esse conflito de interesses, há muito tempo a noção de lide é debatida em sua aplicação no Direito Processual Penal, pois o conteúdo aplicável ao Direito Processual Civil, após evidente construção da lide como conflito de interesses, não encontraria total correspondência na persecução penal.

Por isso, Jacinto Nelson de Miranda Coutinho (1998, p. 136-139) trata a inexistência de um conflito de interesses nos atos procedimentais (processuais) durante a persecução penal, discutida e relacionada tão somente ao jus puniendi do Estado e, assim, entende por caso penal a expressão ideal para substituir a palavra lide na seara criminal. Isso porque não há pretensão tecnicamente exposta por um titular do direito objeto do conflito, ainda que estivéssemos diante da ação penal privada, pois o que se vislumbra na Ação Penal é percepção da responsabilidade jurídico-penal do acusado e a consequente aplicação da sanção penal, caso sobressaia sentença penal condenatório.

Por outro lado, Aury Lopes Júnior (2014, p. 807) adverte a inexistência de um Processo Cautelar na persecução penal, bem como de uma ação cautelar propriamente dita, mas sim uma sistemática criada a partir de medidas cautelares penais, “a serem tomadas no curso da investigação preliminar, do processo de conhecimento e até mesmo no processo de execução”.

No tocante à provisoriedade, em vista de sua possível aproximação do Processo Civil, tem-se sua diferença com as tutelas de urgência, em que a satisfatividade é definida com o seu dado basilar. Por isso, a diferença entre a tutela provisória e a cautelaridade aplicável à persecução penal, da qual se presume a existência das medidas cautelares penais, é a não-satisfatividade, em nenhuma das suas hipóteses, bem como a impossibilidade de uma execução provisória da decisão cautelar, o que importaria na prisão do acusado (BARROS; MACHADO, 2011, p. 14).

Isso porque, em divergência ao decidido pelo Supremo Tribunal Federal em sede do julgamento, por exemplo, do Habeas Corpus n.º 152.752, em 5 de abril de 2018, em desastroso precedente,não é possível manejar a execução provisória da decisão condenatória antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, sob pena de ameaça ao devido processo e ao estado de inocência da pessoa acusada, mesmo que decidida em segunda instância e pendente de reexame pelos tribunais superiores, por evidente agressão às garantias constitucionais.

2.1 A imprecisão da tutela provisória aplicada ao processo penal: uma leitura a partir do processo constitucional

Como afirmado anteriormente, a provisoriedade no Processo Penal é constituída somente por medidas cautelares, daí porque o termo tutela cautelar é mais técnico ao impreciso conceito da tutela provisória, que em nada se aproxima da natureza do processo penal. Isso porque, com o advento da Lei n.º 12.403, de 2011, o legislador pretérito procurou adequar a sistemática processual penal à realidade brasileira e à necessidade de se perceber a constitucionalização da persecução penal sem adiantar o mérito da decisão judicial.

Essa preocupação se confunde com o entendimento de que a tutela cautelar, no Processo Penal, está limitada basilarmente pela presunção de inocência, a partir da leitura constitucional (Constituição da República de 1988, art. 5º, inciso LVII) de que a verificação da culpa só se confirma com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Antes de outras considerações, é importante notar o esforço científico em adotar aportes teóricos que relacionam os procedimentos judiciais em consideração aos direitos fundamentais dos sujeitos processuais, assim definidos [os direitos fundamentais] como aqueles direitos essenciais à pessoa humana, assumidos nos disposições constitucionais das democracias modernas, sejam eles os direitos de defesa ou os direitos prestacionais (SARLET, 1998), de modo a limitar o exercício das funções estatais.

Assim, considerando o caráter fundamental que lhe é atribuído, a própria Constituição da República de 1988 resguarda a existência do processo enquanto instituição democrática, como bem define José Alfredo de Oliveira Baracho (1999, p. 89), razão pela qual sua identificação somente se legitima como garantia dos direitos fundamentais.

Por isso, Fernando Tavares, Bruno de Mattos, Érico Casagrande e Zamira de Assis (2008, p. 145) encontram “no modelo processual instituído em bases principiológico-constitucionais (...)”determinada relação com a “implementação de direitos fundamentais, o que se dá por meio de um processo que possibilite a ampla argumentação em um espaço e tempo adequados” em distanciamento à concepção majoritária de que o processo é simplesmente um instrumento da jurisdição, sem lhe trazer a nota que lhe é devida.

Pelo contrário: a jurisdição estatal, enquanto materialização da função precípua do Estado-Judiciário, somente se valida por um processo anterior, enquanto instituição de matriz democrática, que lhe confere institutos próprios da procedimentalização das demandas levadas à sua apreciação. A jurisdição, portanto, é instrumento do processo.

As garantias processuais constituem a real efetivação dos direitos fundamentais por meio do processo, contemporaneamente definidas por uma base de princípios (espécie da norma jurídica) extraídos da Constituição da República de 1988, que, consolidada por seu traço sustentador do processo, o devido processo constitucionalmente democrático: direito de amplo acesso à jurisdição, com a provocação do Estado-Judiciário diante da visão do processo como metodologia de defesa dos direitos fundamentais; garantia do juízo natural; garantia do contraditório, notada pela influência e não surpresa na produção do pronunciamento decisório;[3] garantia da ampla defesa, com a intervenção da defesa técnica; garantia da fundamentação das decisões judiciais, com base na produção probatória; garantia da razoável duração do processo (BRÊTAS, 2015, p. 165 e 166).

Para além desses princípios processuais, não seria possível prescrever a tutela cautelar no Processo Penal da mesma forma com que se procede na análise dos institutos cíveis, o exige uma leitura que condicione a existência de seus institutos somente diante da proteção dos direitos e liberdades individuais do sujeito enquanto detentor de direitos.

Não é possível, na concepção democrática de Estado, permitir práticas distantes das garantias emanadas da Constituição da República de 1988, notadas aquelas descritas anteriormente, para que o processo se firme como garantia de efetivação dos direitos fundamentais do acusado e dos demais sujeitos processuais.

Tal leitura afasta, por exemplo, a ideia inicialmente adotada de que há um poder geral de cautela na tramitação da persecução penal, pois ao magistrado não é conferida a possibilidade de inventar qualquer medida cautelar estranha àquelas descritas na norma processual penal, já que estará vinculado aos limites que a lei lhe confere (LOPES JÚNIOR, 2014, p. 808).

Possível noção de cautelaridade, no Processo Penal é constituída por medidas cautelares, definidas como “(i) probatórias, quando objetivam preservar os elementos de provas necessários para a imputação; (ii) patrimoniais, quando visam impedir a dilapidação do patrimônio do acusado (...); e, por fim, (iii) as medidas cautelares pessoais” (BARROS; MACHADO, 2011, p. 34).

As medidas cautelares pessoais no Processo Penal foram substancialmente modificadas pelo advento da Lei n.º 12.403, de 2011, legislação que acabou por inovar uma “teoria geral de cautela penal”ao estabelecer alguns requisitos e fundamentos objetivos, com o fito de limitar discricionariedade do agente julgador em sua devida aplicação (CHOUKR, 2011, p. 36).

Dessa interpretação, as medidas cautelares pessoais recebem características próprias, segundo sua natureza, e por isso constituem-se como: excepcionais, pois fundadas somente em imediato estado de flagrância ou justificada com o início da ação penal; exigidas demonstração da real necessidade na aplicação da medida; ausência de um caráter satisfativo, como dito anteriormente, por lhe faltar a possibilidade de execução provisória da pena de prisão ou da absolvição do acusado; e, por fim, a exigência de prévia e limitada previsão legal, já que o juízo terá ausente um poder geral de cautela que permita a aplicação de medidas cautelares fora daquelas previstas em lei (BARROS; MACHADO, 2011, p. 34).

Esse contexto surge como máxima efetivação das diretrizes constitucionais que, de modo abrangente, exigem motivação do agir decisório capaz de limitar a liberdade do indivíduo. Por isso, as medidas cautelares serão decretadas por meio da garantia do devido processo constitucionalmente democrático, do qual se presume a ampla argumentação quanto aos limites de sua incidência, com a participação de todos os envolvidos no pronunciamento estatal (garantia do contraditório e da ampla defesa).

Então, consoante o art. 282, incisos I e II, do Código de Processo Penal, as medidas cautelares pessoais serão decretadas observando impreterivelmente dois requisitos, quais sejam, a adequação e a necessidade.[4] A adequação tem como fundamento a motivação da medida cautelar quanto aos fins pretendidos em sua decretação, considerando fato penal concreto, ao passo que a necessidade confronta-se com a extensão de imprescindibilidade de sua real aplicação, perquirindo qual a medida condigna ao caso analisado (LOPES JÚNIOR, 2014, p. 808).

Para Flaviane de Magalhães Barros e Felipe Daniel Amorim Machado (2011, p. 50) a adequação pode ser vislumbrada como um requisito subsidiário ao requisito da necessidade, “pois só se analisará a adequação de uma medida cautelar pessoal, caso ela se revele imprescindível, ou seja, necessária”,argumento considerável e de suma importância diante da coexistência de outras medidas cautelares pessoais diversas da prisão, presentes no art. 319, do Código de Processo Penal.[5]

A existência de medidas cautelares diversas da prisão e os novos requisitos autorizadores dessa imposição desautorizam o agente julgador a agir de supetão, como se fosse dispensável o intenso debate acerca da decisão que imporá no tolhimento da liberdade individual antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Essa reflexão é importante para desvincular a repetida cultura do cárcere da prática jurisdicional no Brasil, sob o argumento de que a decretação da prisão preventiva é a única solução para efetivar a persecução penal.

3 A PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA A PARTIR DA PRISÃO EM FLAGRANTE DE DELITO: A SISTEMÁTICA ADOTADA PELO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

Antes do aprofundamento sobre a prisão preventiva, torna-se necessário entender o instituto da prisão em flagrante para, por conseguinte, perquirir a sistemática de aplicação das medidas cautelares pessoais no Processo Penal.

Tecnicamente, a prisão pode ser entendida como qualquer ato que restrinja o exercício da liberdade individual, a partir de uma limitação física em qualquer espaço, ao passo que, na classificação escorreita, custódia constitui-se como o ato de manter um suspeito ou acusado na prisão, a partir do ato antecedente de detê-lo denominado captura (CASTELO BRANCO, 2001 p. 4).

A prisão em flagrante, então, deriva da ocorrência da atividade delituosa, pois o cometimento da infração é latente e sensorialmente perceptível, em sua ardência momentânea, e até mesmo presumida em sua ocorrência, a partir de fatores concretos que assim encaminhem.

Essa percepção visual ou até mesmo a presunção diante da prática do delito, portanto, “impõe ao Estado e faculta ao particular o dever de impedir a consumação do crime ou a fuga de seu autor, podendo, para tanto, detê-lo” (BARROS; MACHADO, 2011, p. 51), constituindo-se o que a doutrina designa também por fumus comissi delicti, ou seja, a percepção sensorial da existência do delito por sua inequívoca visibilidade, o que acarreta indícios (e não robustez probatória) suficientes de autoria e prova da materialidade.

Para Maria Ignez Lanzelllotti Baldez Kato (2005, p. 132), a prisão em flagrante pode ser justificada como um instrumento estatal utilizado para trazer meramente a “resposta social ao sujeito que se encontra em estado flagrancial na prática de algum ilícito”, de modo a retirar de sua instituição o caráter cautelar. De fato, a prisão em flagrante não se caracteriza como prisão provisória propriamente dita, pois necessita de demarcação fática e jurídica para que dela decorra outra decisão verdadeiramente cautelar, fundamentada e motivada com base em argumentos sólidos para manter o indivíduo custodiado pela via da prisão preventiva.

3.1 A conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva

Como anteriormente informado, a Lei n.º 12.403, de 2011, trouxe inovações quanto à sistemática de aplicação das medidas cautelares, sobretudo em relação ao esforço para vislumbrar: a necessidade para a aplicação da lei, auxiliar na investigação ou instrução criminal, ainda para coibir a prática de novas infrações penais; e a adequação da medida cautelar, segundo a gravidade do delito, as circunstâncias do fato e as condições daquele contra qual a medida recairá.

Ainda no art. 282 do Código de Processo Penal e respectivos parágrafos, as medidas cautelares sempre serão decretadas cumulativa ou isoladamente, de ofício pelo Estado-Juiz ou a requerimento das partes e, no curso da investigação criminal, somente por requerimento do Ministério Público ou por representação da autoridade policial (vedação de decretação, de ofício, durante o curso do inquérito policial). É importante ressaltar que, consoante art. 282, §3º, com exceção dos casos de urgência ou quando se vislumbra a ineficácia da medida, o juiz determinará a intimação da parte contrária para que, comparecendo em juízo, crie-se um espaço dialético capaz de influenciar o pronunciamento estatal acerca da decretação da medida (crivo do contraditório prévio).[6]

Em dinâmica muito apropriada com a garantia constitucional da presunção de inocência, a qual balizará o devido processo e a imposição de medidas cautelares no Processo Penal, a prisão somente será decretada se, ao analisar o caso concreto, não for cabível a decretação de medida cautelar diversa da prisão, sob o argumento de que, como ultima ratio, somente se legitima se ausentes outras medidas menos gravosas, conforme apresentado no art. 282, §6º, do Código de Processo Penal.

A esse argumento, soma-se a irrestrita visualização do princípio da proporcionalidade, exigindo do agente julgador a argumentação “entre a gravidade da medida imposta com a finalidade pretendida, sem perder de vista a densidade do fumus commissi delicti” e o chamado periculum libertatis (LOPES JÚNIOR, 2014, p. 819). Esse mandamento conduz sopesar qual o perigo real e concreto da decisão pela liberdade do autuado ou mesmo do réu no curso da persecução penal, sob risco de fuga ou frustração da instrução criminal.

Após a prisão em flagrante, o agente deve ser encaminhado imediatamente perante a autoridade policial competente (Delegado de Polícia), que lavrará o respectivo Auto de Prisão em Flagrante de Delito (APFD), ouvirá o condutor do flagrante, as possíveis testemunhas e, por fim, interrogará o agente conduzido em flagrante, respeitado o seu direito constitucional ao silêncio (art. 5º, inciso LXIII da Constituição da República de 1988).

Caso não seja possível fixar fiança, o Delegado de Polícia ratificará o flagrante, indicará o recolhimento em unidade prisional e, em 24h, remeterá o APFD para o juízo competente, com cópia integral para a Defensoria Pública, caso o acusado não indique advogado de sua confiança; a família do preso também será cientificada da sua prisão, bem como o Ministério Público.

Com esse recebimento, pelo juízo competente, poderá tomar três decisões, conforme o art. 310 do Código de Processo Penal: relaxar o flagrante, se manifestadamente ilegal a prisão em flagrante; converter o flagrante em preventiva (ou decretar alguma medida cautelar pessoal, segundo a necessidade, adequação e proporcionalidade); e, por fim, conceder liberdade provisória, com ou sem fiança, segundo estabelecido em lei.

No ordenamento jurídico brasileiro, a fiança pode ser entendida como “uma contracautela, uma garantia patrimonial, caução real, prestada pelo imputado (...)”e um “elemento inibidor, desestimulante, da fuga do imputado, garantindo, assim, a eficácia da aplicação da lei penal em caso de condenação” (LOPES JÚNIOR, 2014, p. 918).

É importante ressaltar a existência dos crimes inafiançáveis, quais sejam, o racismo, a prática de tortura, o tráfico de entorpecentes e drogas afins, os crimes hediondos, o terrorismo e a ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático, consoante disposição constitucional demarcada. Contudo, a existência da vedação constitucional diz respeito à aplicação da fiança e não restringe a possibilidade de concessão da liberdade provisória sem fiança, pois, caso ausente o periculim libertatis, o magistrado poderá manter o estado de liberdade anterior à prisão,ao perceber dialeticamente a inadequação da prisão e, por conseguinte, a aplicação de outra medida cautelar ao caso concreto.

O magistrado, por outro lado, ao perceber a existência de causa excludente da ilicitude (estado de necessidade, exercício regular do direito, legítima defesa ou estrito cumprimento do dever legal), poderá conceder liberdade provisória ao acusado, que se comprometerá a comparecer a todos os atos processuais. Nessa compreensão, a expressão poderá deveria ser substituída por deverá, pois, se o agente cometera o delito amparado por causa de exclusão do crime, não há de se falar em necessidade de uma prisão preventiva por ausência de alguns elementos volitivos sobre a responsabilização jurídico-penal.

Caso opte pela conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva, o juiz deverá analisar, em ordem: a existência de prova da materialidade e indícios de autoria de um crime doloso, o que constitui o fumus comissi delicti, cuja pena máxima seja maior que quatro anos; b) a necessidade da prisão, em sede do periculum libertatis do agente; c) a presença dos fundamentos do art. 312 do Código de Processo Penal; d) o descabimento das demais medidas cautelares descritas no art. 319 do Código de Processo Penal; e) e, por fim, a adequação da prisão ao caso concreto (BARROS; MACHADO, 2011, p. 88).

Em uma sistemática processual que busca limitar, a partir da Constituição da República de 1988, as práticas oficiosas e automáticas de decretação da custódia do preso em flagrante, os fundamentos da prisão preventiva descritos no art. 312 do Código de Processo Penal, auxiliados pelos requisitos constantes no mesmo artigo, funcionam como instrumento de controle judicial e obsta possível arbítrio decorrente desse movimento cautelar.

Os requisitos constantes na segunda parte do art. 312, como já observado anteriormente, formam o chamado fumus comissi delicti, reunidos por prova da materialidade e indícios de autoria. Por outro lado, os fundamentos para a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva são quatro: garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, conveniência da instrução criminal e garantia de aplicação da lei penal.

O legislador de 2011 errou ao prescrever alguns conceitos abertos, deixando ao agente julgador a resolução daquilo que sentirá ao analisar o caso concreto. Tal escolha, ao que nos parece, trouxe insegurança jurídica quanto à extensão desses mesmos conceitos aplicáveis ao caso em análise, o que deve ser efetivamente combatido pela técnica jurídica frente ao subjetivismo próprio de um sistema marcado pela força da autoridade.

O primeiro e o segundo fundamentos, garantia da ordem pública e ordem econômica, receberam inúmeras críticas, dos mais variados autores, diante da imprecisão terminológica que lhe são inerentes. Para Guilherme de Souza Nucci (2014, p. 63), faltou ousadia ao legislador quando da definição dessas noções, o que caminhou a prática para “continuar tolerando seja o juiz o protagonista da conceituação, conforme o caso concreto”,pois alguma “interferência, nesse setor, poderia dar margem ao cerceamento no uso da prisão cautelar”.

Esse argumento deve ser lido com o devido cuidado, pois a liberdade conferida ao magistrado deve encontrar respaldo na lei democrática e nos argumentos apresentados pelos demais sujeitos processuais, não unicamente em seu subjetivismo, sob pena de se perpetuar um sistema inseguro e paradoxal.

Por isso, Flaviane de Magalhães Barros e Felipe Daniel Amorim Machado (2011, p. 91 e 92) advertem que o conceito de garantia da ordem pública jamais pode se vincular ao ideário de clamor social (opinião pública acerca da extensão do delito, pois a certeza da decisão cautelar se fundamenta em argumentos e dados jurídicos extraídos do APFD ou mesmo do processo, quando decretada em tal fase), credibilidade da justiça (já que a segurança pública não é dever do Estado-Judiciário), e, ainda, na sensação de gravidade do delito ou para resguardar a integridade física do acusado (como se a prisão estivesse adequada ao fim).

O conceito de garantia da ordem econômica tem por substrato a Lei n.º 8.884, de 11 de junho de 1993, recentemente modificada pela Lei n.º 12.529, de 30 de novembro de 2011, como instrumento de tutela de determinadas condutas que “afetam a tranquilidade e harmonia da ordem econômica, seja pelo risco de reiteração de práticas que gerem perdas financeiras enormes, seja por colocar em perigo a credibilidade e o funcionamento financeiro”de seu mercado financeiro (LOPES JÚNIOR, p. 855).

Contudo, danos econômicos não seriam restituídos pela simples decretação da prisão preventiva enquanto medida cautelar pessoa, o que, para Eugênio Pacelli de Oliveira (217, p. 264), o mais adequado seria aplicar medida cautelar patrimonial de sequestro dos bens do acusado ou indiciado, de modo a satisfazer as peculiaridades dos desvios econômicos sentidos.

A hipótese de conveniência da instrução criminal é fundamento cautelar por excelência, pois se relaciona com o prejuízo concreto que a liberdade do acusado pode trazer para a devida persecução penal. Esse fundamento pode ser percebido, por exemplo, quando há real ameaça às testemunhas ou à vítima antes de uma audiência previamente designada pelo juízo, bem como quando o acusado age para destruir provas hábeis à sua responsabilização jurídico-penal.

O mesmo se aplica ao fundamento de assegurar a aplicação da lei penal, idealizada pela prova inequívoca de fuga do acusado. Assim, em caso de possível sentença condenatória, é assegurada a aplicação da abstrata lei penal ao caso concreto, após o devido processo e a estrutura dialética do processo e, para tanto, o acusado ou indiciado poderá se fazer presente a todos os atos processuais, a fim de resguardar a validade do processo.

Vale ressaltar, nesse sentido, que a decisão pela prisão fundamentada na aplicação da lei penal somente se legitima se a possibilidade fuga for concreta, por exemplo, se o acusado possuir moradia em outro país e adquirir passagem para tal destino, sem requerimento prévio ao juízo, de modo a afastar a possibilidade de decretação de sua prisão pela simples presunção da fuga (BARROS; MACHADO, 2011, p. 93).

Perpassada tal análise, é importante notar que a decretação da prisão preventiva, independentemente da fase em que se manifesta, deverá observar irrestritamente o art. 312 do Código de Processo Penal e, ainda, tem nota de revisibilidade, pois toda prisão injustificada torna-se ilegal. Isso significa dizer que a decisão proferida pelo juízo competente pode ser revisitada no decorrer de sua decretação, por meio de provocação da parte ou mesmo de ofício, numa espécie de reexame obrigatório, a fim de perquirir se os motivos ensejadores da decretação da prisão preventiva ainda persistem.

Nessa senda, o Relatório sobre o uso da prisão preventiva nas Américas – Introdução e recomendações, elaborado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e editado em 2001, descreve várias preocupações afirmadas deste então naquilo que concerne à arbitrariedade e ilegalidade da prisão preventiva em vários países. Tal relatório reservou como fundamento idôneo à decretação da prisão preventiva o risco de fuga do acusado e a obstrução do processo, quando a sua liberdade colocar em risco a devida persecução penal.[7]

Contudo, a sistemática para a decretação da prisão preventiva é sorrateiramente desconsiderada pela grande maioria magistrados dos magistrados brasileiros. Entre os anos de 2013 e 2015, o Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PPGD/PUC Minas) organizou projeto de pesquisa intitulado “A reforma e o monitoramento das alterações no Código de Processo Penal sobre as prisões e medidas cautelares – Lei 12.403/2011”, coordenado pelos Professores Doutores Flaviane de Magalhães Barros e Leonardo Marinho Augusto Marques (2014).

A pesquisa, metodologicamente dividida em quatro subgrupos, procurou analisar as decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, a fim de perceber se os pronunciamentos decisórios observavam as inovações trazidas pela Lei n.º 12.403, de 2011.

Dentre os vários resultados, destaca-se o trabalho realizado pelo subgrupo intitulado Prisões Preventiva de Ofício, que analisou decisões em sede de habeas corpus entre o segundo semestre de 2011 e durante todo o ano de 2012 e 2013, no Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Dos cento e vinte e quatro acórdãos analisados, utilizando aquele título como chave de busca, em nenhum dos pronunciamentos houve a participação prévia da defesa, efetivação da garantia do contraditório, na decretação da prisão preventiva (MARQUES, 2014).

Esse dado, para ser exato, aliado aos números mais atualizados sobre o sistema prisional brasileiro, divulgados pelo Ministério da Justiça em dezembro de 2017, com levantamentos flutuantes de junho de 2016 , indica população carcerária de 726.712mil pessoas encarceradas, da qual tem-se maioria jovem (55% são jovens com até 29 anos de idade), composta por farta parcela de negros e pardos (64% do número geral de pessoas presas), dentre 75% estão entre analfabetos e concluintes do Ensino Fundamental: ou seja, 75% de pessoas que sequer acessaram o Ensino Médio. Do número total, 41% ainda são presos provisórios, sem julgamento.

4 A AUDIÊNCIA DE APRESENTAÇÃO COMO INSTITUTO DE EFETIVAÇÃO DAS GARANTIAS FUNDAMENTAIS

Por força de um movimento macroestrutural, a proteção da pessoa enquanto sujeito de direitos, encontra correspondência em diversos documentos e tratados internacionais. A Convenção Americana de Direitos Humanos, nesse sentido, é importante documento para o estudo da Ciência Processual e coaduna com a prática jurídica internacional de ajuste das realidades humanas em detrimento do poder estatal despótico, sentimento típico do período pós-Guerras, a fim de elevar a pessoa humana à condição de sujeito titular de direitos demarcados e praticados na esfera política das liberdades.

A Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecida também por Pacto de San José da Costa Rica, fora devidamente ratificada pelo Decreto nº. 678, de 6 de novembro de 1992, da qual se lê, em seu art. 7º, item 5, que qualquer pessoa detida ou retida deve (obrigatoriamente, não há outra opção interpretativa), sem demora (prazo razoável), ser conduzida à presença de um juiz ou outra autoridade competente para exercer as funções judicantes. O referido ponto ainda afirma que o acusado deve ser julgado dentro de um prazo razoável, pois caso contrário deverá ser colocado em liberdade, sem qualquer prejuízo ao processo, não obstando a decretação de medidas que assegurem o seu comparecimento em juízo (medidas cautelares pessoais).[8]

Essa garantia fora reproduzida no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, introduzido no Brasil por meio do Decreto nº. 592, de 6 de julho de 1992, em seu art. 9º, item 3, da qual se percebe a necessidade de apresentação do preso, sem demora, à presença de um juiz ou autoridade legalmente definida para exercer a atividade judicial; há de se destacar a repreensão em tratar a prisão provisória como regra geral, de modo a justificar a custódia primária do indivíduo, condicionando a soltura do agente à aplicação de medidas cautelares pessoais hábeis a garantir o seu comparecimento aos atos processuais.[9]

Essa síntese é amplamente reiterada nas decisões das Cortes Internacionais de Direitos Humanos e, assim, a tardia implementação desse acompanhamento, no Brasil, só pode ter ensejo na existência de uma estrutura político-criminal de desprezo ao esforço internacional de ajuste das medidas cautelares às liberdades individuais da pessoa.

Nesse contexto, muito se discute acerca da audiência de apresentação, de modo a permitir o contato pessoal e real da pessoa presa com a autoridade judiciária competente, após a sua prisão, a fim de perquirir a adequação e necessidade de imposição das medidas cautelares pessoais ao flagranteado.

Por meio de estudo técnico de Direito Comparado realizado pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, a fim de subsidiar cientificamente o Projeto de Lei nº. 544, de 2011, foram divulgados os seguintes dados acerca da audiência de apresentação em alguns países do mundo: no Reino Unido, o prazo é de 24h, prorrogáveis uma ou duas vezes por 36h; na França, o prazo é de 24h, prorrogáveis por mais 48h a pedido da acusação, podendo alcançar 72h em casos específicos e até 120h em suspeita de casos de terrorismo; na Espanha, o prazo para tal audiência é de 48h, prazo idêntico na Suécia e em Portugal, ao passo de que, na Alemanha, é de 47h e 59min; na Argentina, tal prazo é de apenas 6h e, na África do Sul, de 48h, salvo se o último dia do término não houver expediente forense, quando será aplicada a regra processual de postergação do prazo para o primeiro dia útil.[10]

Após a provocação dos juristas e de várias instituições democráticas, o Ministério da Justiça do Brasil, o Conselho Nacional de Justiça e o Tribunal de Justiça de São Paulo firmaram acordo, em 15 de fevereiro de 2015, para o desenvolvimento de um projeto hábil à efetiva implementação da audiência de apresentação no Brasil.

Essa tentativa pragmática, a nosso ver, demonstrou-se tardia e descompassada com os demais países do mundo que assumiram posturas democráticas em suas políticas público-criminais, o que, no Brasil, fora opção legislativa desde a promulgação da Constituição da República de 1988 e da ratificação do Pacto de San Jose da Costa Rica e do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, ambos em 1992.

Em fluxograma disponibilizado no Portal do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), é possível entender a dinâmica adotada pelos Tribunais que aderiram ao projeto de implementação da audiência de apresentação no Brasil, em ordem: a) o agente é preso e apresentado à Autoridade Policial (Delegado de Polícia); b) ato contínuo, o Auto de Prisão em Flagrante de Delito (APFD) é formalizado e será agendada data para a apresentação da pessoa presa diante do magistrado, em data disponibilizada na pauta, pelo juízo, dando ciência ao advogado do acusado, se devidamente constituído; c) antes da apresentação, o agente realizará Exame de Corpo de Delito e será enviado para um Centro de Detenção Provisória, a fim de aguardar a respectiva apresentação; d) o APFD é protocolizado e apresentado diante do preso em juízo, o qual será digitalizado, incorporado pela Certidão de Antecedentes Criminais, e dado vista às partes em audiência. Nessa assentada, é garantida a entrevista do acusado com o seu advogado ou com o defensor público indicado para o ato; e) com o início da audiência de apresentação, é dada a palavra ao Ministério Público, para que se pronuncie, ouvido o autuado e, por fim, consideradas as manifestações da defesa técnica; f) o último ato, então, é a decisão do magistrado, que poderá tomar duas precípuas medidas: as judiciais, consubstanciadas no relaxamento da prisão em flagrante (com a expedição do respectivo alvará de soltura e distribuição do APFD), concessão da liberdade provisória com ou sem fiança (com a expedição do respectivo alvará de soltura e distribuição do APFD), aplicação das medidas cautelares diversas da prisão (com a expedição do respectivo alvará de soltura e distribuição do APFD) e, por fim, converter a prisão em flagrante em prisão preventiva (com a expedição do respectivo mandado de prisão e distribuição do APFD). As outras medidas são as não-judiciais, consubstanciadas na aplicação de medidas assistenciais ou sociais e, ainda, na mediação penal, com a definição do procedimento e expedição do respectivo alvará de soltura.[11]Do projeto realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), inicialmente com o Tribunal de Justiça de São Paulo, sobrevieram Termos de Adesão com todos os Tribunais de Justiça dos Estados brasileiros, com o intuito de implementar nas jurisdições estaduais a dinâmica da audiência de apresentação e alterar a cultura desastrosa do cárcere mensurada no descompromisso em analisar a real adequação e necessidade da prisão.[12]

É importante ressaltar que a audiência de apresentação não se relaciona com uma audiência de instrução e julgamento, pois sua procedibilidade não se vincula à produção das provas para a prolação da decisão de mérito, mas sim em aferir qual o mais adequado pronunciamento cautelar no âmbito do caso concreto analisado (PRUDENTE, 2015, p. 13).

Esse argumento pode parecer óbvio em sua integralidade, mas em julho de 2016, na Comarca de Xapuri (Acre), um magistrado proferira sentença condenatória no mesmo dia da audiência de apresentação, após denúncia do Ministério Público e instrução probatória. Usando de celeridade absurda, aparentemente coadunada pela defesa, que abrira mão da apresentação da resposta à acusação no prazo legal descrito no art. 396 do Código de Processo Penal, a decisão proferida não encontra correspondência, no Estado Democrático de Direito, com a noção do processo em sua concepção de defesa dos direitos fundamentais.[13]

Isso porque, da leitura do ordenamento jurídico democraticamente erigido com base na Constituição da República de 1988, a duração razoável do processo jamais pode desrespeitar direitos e garantias fundamentais, de modo a retardar no tempo ou prolongar-se por demais, desconsiderando o tempo devido para a manifestação das partes e apresentação das questões levadas à apreciação do Estado-Judiciário.

Em que pese o eficiente trabalho realizado pelo Conselho Nacional de Justiça, o Projeto de Lei do Senado nº. 554, de 2011, de autoria do Senador Antônio Carlos Valadares , recebido na Câmara dos Deputados como Projeto de Lei n.º 6620, de 2016, carece de urgente aprovação para que, de forma clara e objetiva, o Brasil faça a escolha definitiva pela sistemática adotada na audiência de apresentação.

Isso porque a prisão cautelar sempre deverá esmerar-se na justificação de sua decretação, com base na lei e na estrutura do devido processo já que a prisão, mais a demais, salta aos olhos da população desavisada como estrutura funcionalista dentro da estrutura social para encerrar o problema da criminalidade, com possível justificação na visão ideológica de que o encarceramento é sanção por excelência (KATO, 2005, p. 3).

Em Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 5240, ajuizada pela Associação de Delegados de Polícia do Brasil, perante o Supremo Tribunal Federal, fora questionada a legalidade das audiências de apresentação, sob o argumento de que tal instituto seria uma inovação no ordenamento jurídico do Estado de São Paulo, e, em razão da imprevisão na lei federal, o tratado firmado entre o Conselho Nacional de Justiça, o Ministério da Justiça e o Tribunal da Justiça de São Paulo seria inadequado para legislar sobre a matéria (competência exclusiva da União para legislar sobre matéria processual).

Em acórdão publicado no dia 1º de fevereiro de 2016, sob a relatoria do Ministro Luiz Fux, o plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu, por unanimidade dos presentes, pela improcedência do pedido manejado na respectiva Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 5240, sob o argumento de que as normas de direito internacional ratificadas pelo Brasil resguardavam a legalidade de tal instituto. Por fim, tal decisão indicou o nome audiência de apresentação para evidenciar o ato de apresentação do autuado ao juízo competente, e não audiência de custódia, bem como prescreveu a adoção da sistemática em todos os tribunais brasileiros.[14]

Nesse aspecto, a audiência de apresentação firma-se como garantia constitucionalizada de defesa dos direitos fundamentais e liberdades individuais do flagranteado, na certeza de que a persecução penal jamais poderá ofendê-los. O paradigma eminentemente democrático extraído do bojo constitucional exige o arranjo devido no exercício das funções estatais e, nos pronunciamentos do Estado-Judiciário, a melhor interpretação sempre se conduzirá ao acesso do sujeito ao processo entendido como garantia de direitos fundamentais.

Dada a ardente importância do instituto, torna-se indispensável representá-lo do ponto de vista pragmático, com formação constante junto aos órgãos estatais, já que muitos dos jurisdicionados ainda não entendem a importância real de debate sobre a decisão cautelar que determinará a prisão do flagranteado.

Não é incomum ouvir a alegoria de que a audiência de apresentação somente tem por fundamento a denúncia de maus-tratos cometidos contra os flagranteados, muitas vezes realizadas por policiais militares, usando, os mais desavisados, da expressão "audiência do X9" ou "audiência do cagoete". Isso não é verdade, muito menos coaduna com os fins precípuos do instituto da audiência de apresentação, já que a prática de qualquer ilícito na condução da prisão em flagrante, como a tortura e os maus tratos desferidos injustamente aos conduzidos, pode ser alegada a qualquer momento.

O que se almeja, nessa dinâmica, é a apresentação do autuado perante a autoridade judiciária para a formulação de um pronunciamento jurisdicional produzido entre as partes, sob o crivo do devido processo constitucionalmente democrático, pressuposto da ampla defesa, do contraditório e de uma decisão legalmente fundamentada e motivada, a fim de determinar a aplicação de uma medida cautelar pessoal ideal ao caso examinado, a partir de dados concretos e amplamente debatidos na estrutura dialética do processo.

5 CONCLUSÃO

Apresentam-se como conclusões preliminares, pois passíveis de refutação crítica, os seguintes pontos:

O Direito Processual Penal deve ser interpretado a partir da Teoria do Processo Constitucional, para o qual o processo é constituído como garantia de direitos fundamentais, formado pelo devido processo constitucionalmente democrático na efetiva aplicação as garantais constitucionais da ampla defesa, contraditório, isonomia, fundamentação legal e motivação das decisões judiciais e, por fim, pela defesa de um procedimento sem dilações indevidas.

A nota mais destacada na estrutura principiológica processual penal, por força constitucional democrática, é a garantia da presunção de inocência, da qual se extrai a indispensabilidade do devido processo para aferir a responsabilidade jurídico-penal do agente acusado. Assim, a pessoa será considerada culpada somente após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, perpassado o seu direito de defesa.

O devido processo e a presunção de inocência balizarão a tutela cautelar no Processo Penal, que, por tais garantias constitucionais, jamais será entendida como antecipação dos efeitos da sentença criminal, com possível antecipação da pena. Assim, não há um Processo Cautelar da mesma forma como se vislumbra no Processo Civil, o que dá, ao Processo Penal, diversa noção de cautelaridade.

Nesse sentido, a cautelaridade no Processo Penal se dá pela aplicação das chamadas medidas cautelares pessoais, patrimoniais e/ou probatórias, aproximadas com o procedimento cautelar. O estudo apresentado versou sobre as medidas cautelares pessoais, decretadas sempre a partir da leitura da necessidade real de sua imposição e na adequação da medida ao caso concreto, considerando aquelas descritas no ordenamento jurídico, notabilizadas pela proporcionalidade da medida e o fato concreto.

Além das notas de adequação e necessidade, as medidas cautelares são decretas a partir de dois requisitos: fumus comissi delicti, para perceber prova da materialidade e indícios de autoria, e periculum libertatis, de modo a perquirir qual o reflexo da liberdade do acusado em relação à investigação e ao iter processual.

A prisão, assim, constituí-se como ultima ratio, ou seja, somente decretada quando as demais medidas não forem suficientes para resguardar a devida composição processual, já que a liberdade é direito fundamental e sua mitigação deve ser justificada. Para a decretação da prisão preventiva, somados aos itens acima delineados, é necessária a vislumbração de quatro fundamentos, com suas devidas considerações críticas, quais sejam: garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, conveniência da instrução criminal e assegurar a aplicação da lei penal.

A prisão preventiva somente pode ser decretada se legalmente fundamentada e motivada, de modo a perceber a aplicação de todas as garantias processuais. Por isso, decisões que desconsiderem o contraditório e a necessidade real de perquirir a extensão do decreto cautelar estão em descompasso com a matriz democrática extraída do bojo constitucional, do qual a pessoa tem o direito de erigir a decisão que lhe afetará.

Contra a cultura do cárcere, que entende a prisão cautelar como expiação dos males sociais, os tratados internacionais de direitos humanos firmaram a realização da chamada audiência de apresentação (ou audiência de custódia, comumente assim nominada), a fim de possibilitar que, em prazo justo (em até 24h), o autuado em flagrante de delito seja apresentado diante de magistrado para decidir sobre as medidas cautelares aplicáveis ao caso. Tal audiência não tem por objetivo a instrução probatória no limbo preparatório para os atos da persecução penal, mas, diante dos sujeitos processuais, perquirir a real necessidade e adequação de qualquer medida cautelar pessoal aplicada ao caso, como a prisão preventiva.

Em que pese determinada ausência de legislação específica sobre o assunto, por meio de lei federal, considerando a competência da União para legislar sobre direito processual, a audiência de apresentação fora amplamente recepcionada pelo Brasil, ao tornar-se signatário do Pacto de San José da Costa Rica e do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, o que exige, por força dos institutos citados e de sua força constitucionalizada, a ocorrência das audiências de apresentação em todo o território nacional.

A audiência de apresentação contribuirá para reduzir as descomedidas decretações das prisões preventivas, sem a efetiva discussão de sua necessidade e adequação, bem como a possibilidade de sua substituição por outras medidas cautelares, se encarada a partir do debate entre os sujeitos processuais, com deferência à ampla argumentação e construção ideal da decisão por todos os envolvidos, com precípuo fim de efetivar os direitos fundamentais tão caros à pessoa humana.

REFERÊNCIAS

BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Teoria geral do processo constitucional. Revista da Faculdade Mineira de Direito, v. 2, ns. 3 e 4, p.89-154. Belo Horizonte, 1º e 2º sem. 1999.

BARROS, Flaviane de Magalhães. MACHADO, Felipe Daniel Amorim. Prisão e medidas cautelares: nova reforma do Processo Penal - Lei n. 12.403/2011. Belo Horizonte: Del Rey, 2011.

BRASIL. Decreto Lei n. 3.869, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Diário Oficial da União. Brasília, 04 de outubro de 1941.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União. Brasília, 05 de outubro de 1988.

BRASIL, Ministério da Justiça. Levantamento Anual de Informações Penitenciárias – junho de 2016. Disponível em:http://justica.gov.br/noticias/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil/relatorio_2016_junho.pdf;. Acesso em: 8 dez. 2017.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 5240, ajuizada pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil, sobre a legalidade da audiência de custódia. Relatoria do Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 20 de agosto de 2015. Divulgado em 29 de janeiro de 2016 e publicado em 01 de fevereiro de 2016.

BRÊTAS, Ronaldo de Carvalho Dias. Processo Constitucional e Estado Democrático de Direito. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2015.

CASTELO BRANCO, Tales. Da prisão em flagrante. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

CHOUKR, Fauzi Hassan. Medidas cautelares e prisão processual. Rio de Janeiro: Forense, 2011.

CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Relatório sobre o uso da prisão preventiva nas Américas: Introdução e recomendações. Disponível em:http://www.oas.org/pt/cidh/ppl/pdfs/Relatorio-PP-2013-pt.pdf;. Acesso em: 10 jan. 2018.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Dados sobre a Audiência de apresentação e sua implementação no Brasil. Disponível em:http://www.cnj.jus.br/sistema-carcerario-e-execucao-penal/audiencia-de-custodia;. Acesso em: 25 jan. 2018.

COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. A lide e o conteúdo do Processo Penal. Curitiba: Juruá, 1998.

KATO, Maria Ignez Lanzellotti Baldez, A (Des)Razão da Prisão Provisória. Rio de Janeiro: Lumen júris: 2005.

LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Geral do Processo: Primeiros Estudos. 12. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2014.

LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

MARQUES, Leonardo Augusto Marinho. A reforma e o monitoramento das alterações no Código de Processo Penal sobre prisões e medidas cautelares – Lei n. 12.403/2011. 2014. 39p. Projeto de Pesquisa – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Faculdade Mineira de Direito.

NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e Liberdade. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

PRUDENTE, Neemias Moretti.Lições preliminares acerca da audiência de apresentação no Brasil. Revista Síntese de Direito Penal e Processual Penal. São Paulo, v. 16, nº. 93, p. 9-31, agosto de 2015.

SÃO PAULO. Defensoria Pública. Estudo de Direito Comparado para subsidiar o PLS nº. 554/2011. Disponível em: http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/31/documentos/direito%20comparado%20%20prazo%20para%20apresenta%C3%A7%C3%A3o%20do%20preso%20em%20ju%C3%ADzo.pdf. Acesso em: 11 jan. 2018.

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998.

SILVA, Ovídio A. Baptista. Do Processo Cautelar. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

TAVARES, Fernando Horta; MATTOS, Bruno Ferreira Bini de; CASAGRANDE, Érico Vinícius Prado; ASSIS, Zamira de. Urgência de tutelas: por uma teoria da efetividade do processo adequada ao Estado de Direito Democrático. Revista da Faculdade Mineira de Direito, Belo Horizonte, v. 11, nº. 21, p. 145-162, jan. 2008.

THEODORO JÚNIOR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre Melo Franco; PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC: Fundamentos e Sistematização. 3. edição. Editora Forense. Rio de Janeiro, 2016.

ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. São Paulo: Saraiva, 1997.

Notas

[2] Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental. Para melhor e completo entendimento do assunto, que certamente perpassa o objeto de estudo do presente trabalho, ler: DIDER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil: Teoria da Prova, Direito Probatório, Decisão, Precedente, Coisa Julgada e Tutela Provisória. Vol. II. 12. ed. Salvador: JusPodivm, 2017; ANDRADE, Francisco Rabelo Dourado de. Tutela de evidência, teoria da cognição e processualidade democrática. Belo Horizonte: Fórum, 2017.

[3] Para estudo mais aprofundado do contraditório extraído da comparticipação, com suas garantias de influência e não surpresa, ver THEODORO JÚNIOR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre Melo Franco; PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC: Fundamentos e Sistematização. 3. ed. Editora Forense: Rio de Janeiro, 2016.

[4] Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I - necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; II - adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.

[5] Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão : I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável e houver risco de reiteração; VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX - monitoração eletrônica.

[6] Art. 282 (...): § 1o As medidas cautelares poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente. § 2o As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público. § 3o Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo (...).

[7] No Item 21 do referido relatório, lê-se: “Neste aspecto, há mais de duas décadas os órgãos do Sistema Interamericano interpretam e aplicam estas normas, estabelecendo que das mesmas se obtêm, em síntese, os seguintes parâmetros: (i) A detenção preventiva deve ser a exceção e não a regra; (ii) os objetivos legítimos e permissíveis da detenção preventiva devem ter caráter processual, tal como evitar o perigo de fuga ou obstáculos do processo; (iii) consequentemente, a existência de indícios de responsabilidade não constitui razão suficiente para decretar a detenção preventiva de uma pessoa; (iv) mesmo existindo fins processuais, requer-se que a detenção provisória seja absolutamente necessária e proporcional, no sentido de que não existam outros meios menos excessivos para alcançar o fim processual que se persegue e que não se afete desproporcionalmente a liberdade pessoal.

[8] Art. 7º. Direito à liberdade pessoal (...). Item 5: “Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo”.

[9] Art. 9º (...). Item 3: “Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas a soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questão à audiência, a todos os atos do processo e, se necessário for, para a execução da sentença”.

[10] Estudo técnico realizado em 2012, pelo Defensor Público Calor Weis, Coordenador do Núcleo Especializado de Cidadania e de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, passível de óbvia alteração pragmático-legislativa, considerando o atual ano de 2017. Disponível em:http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/31/documentos/direito%20comparado%20%20prazo%20para%20apresenta%C3%A7%C3%A3o%20do%20preso%20em%20ju%C3%ADzo.pdf . Acesso em abril de 2017.

[11] Fluxograma descrito graficamente no Portal do Conselho Nacional de Justiça. Disponível em:http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/destaques/imagem/2015/05/4cf9f3999735af48598d7cecde739fde.jpg. Acesso em: 01 abr. 2017.

[12] Informações descritas no sítio do Conselho Nacional de Justiça. Disponível em:http://www.cnj.jus.br/sistema-carcerario-e-execucao-penal/audiencia-de-custodia.Acesso em: 01 abr. 2017.

[13] Para informações detalhadas do caso. Disponível em:http://www.conjur.com.br/2016-jul-29/tres-dias-homem-preso-ouvido-audiencia-condenado-ac. Acesso em: 01 jan. 2017.

[14] Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 5240, sob Relatoria do Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 20 de agosto de 2015. Divulgado em 29 de janeiro de 2016 e publicado em 01 de fevereiro de 2016.

Autor notes

[1] Mestre em Direito Processual pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Bacharel em Direito pela Faculdade Mineira de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Coordenador do Curso de Direito das Faculdades Unificadas de Teófilo Otoni – Rede de Ensino Doctum. Membro da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Minas Gerais, do Instituto de Ciências Penais (ICP) e do Instituto Brasileiro de Direito Processual Penal (IBRASPP). Professor Universitário, escritor e advogado militante.

Informação adicional

COMO CITAR ESTE ARTIGO: SOARES, Igor Alves Noberto. As medidas cautelares e a audiência de apresentação (audiência de custódia) no processo penal: enfrentamentos a partir da teoria do processo constitucional. Revista de Direito da Faculdade Guanambi, Guanambi, BA, v. 5, n. 1, p. 01-27, jan./jun. 2018. ISSN 2447-6536. Disponível em: http://revistas.faculdadeguanambi.edu.br/index.php/Revistadedireito/article/view/2007. Acesso em: dia mês. Ano. DOI: https://doi.org/10.29293/rdfg.v5i1.2007.

Ligação alternative

http://revistas.faculdadeguanambi.edu.br/index.php/Revistadedireito/article/view/2007 (html)

O que é necessário para a aplicação das medidas cautelares?

A lei prevê dois requisitos para a decretação de uma medida cautelar no processo penal:.
comprovação da necessidade para evitar a prática de novos crimes e para proteger a investigação criminal,.
adequação da medida aplicada às circunstâncias do crime cometido, à gravidade do fato e às condições pessoais do acusado..

Quais os critérios e diretrizes são comuns as medidas cautelares pessoais?

— Para a decretação de medida cautelar restritiva é necessário observar as seguintes regras: 1) motivação; 2) legalidade; 3) sistema acusatório; 4) fumus commissi delicti; 5) periculum libertatis; 6) concretude e contemporaneidade; 7) presunção de inocência.

Quais são os princípios e requisitos para aplicação de qualquer cautelar no Processo Penal?

Os princípios cautelares podem ser definidos em: a) jurisdicionalidade; b) contraditório; c) provisionalidade; d) provisoriedade; e) excepcionalidade e f) proporcionalidade. Começaremos pelo instituto da jurisdicionalidade e, nos demais encontros, daremos sequências aos demais. Vejamos, então.

São características das medidas cautelares no Processo Penal?

As medidas cautelares gozam de quatro principais características: provisoriedade, revogabilidade, substitutividade e excepcionalidade. São, portanto, nove os números das medidas cautelares diversas da prisão elencadas no artigo 319, CPP.