Quando ocorre a tentativa de homicídio?

12 de Setembro de 1997

Algumas questões sobre o tribunal do júri

1. Introdução

O Tribunal do Júri vem detalhadamente traçado no nosso Diploma Processual Penal (arts. 406 a 497). Não obstante este minucioso tratamento por parte do legislador, inúmeras questões têm surgido ao longo do tempo. Trataremos neste trabalho de três: a primeira relaciona-se à desclassificação e à necessidade de representação, a segunda refere-se à quesitação e à autodefesa e a última examina qual é o recurso cabível da decisão dos jurados que nega atenuante comprovada nos autos.

2. Desclassificação no Procedimento do Júri e representação

A desclassificação de tentativa de homicídio para lesão corporal ocorre no procedimento do júri quando não restar comprovado o animus necandi, ou seja, que o réu agiu com dolo de matar. Algumas vezes, verifica-se, após a instrução, que o réu tinha apenas a intenção de lesionar a vítima. Neste caso, a decisão do juiz seguirá o disposto no art. 410 do CPP, e o processo será remetido à vara criminal singular.

A desclassificação, também, tem lugar no julgamento em plenário, aqui ela será feita pelo Conselho de Sentença, através das respostas aos quesitos formulados. E caberá ao juiz presidente prolatar a sentença (492, § 2º, CPP).

Feita a desclassificação, estamos diante, agora, de um crime de lesões corporais. Com o advento da Lei nº 9.099/95, este delito na sua modalidade leve e culposa tornou-se condicionado à representação da vítima ou de seu representante legal.

Nos dois casos acima, a denúncia foi oferecida sem a representação, uma vez que ela não constitui condição de procedibilidade para o delito de homicídio tentado.

Mas, agora, o crime a ser julgado é de lesão corporal. Precisará o juiz converter o julgamento em diligência, a fim de que a vítima possa ser intimada para representar?

Constitui, a representação, a manifestação de vontade da vítima para que o fato seja investigado e a autoria apurada. A lei não prevê uma forma especial para este ato. Assim, se durante a fase inquisitória a vítima procurou a autoridade policial e expressou desejo em prosseguir com a investigação, ou ainda, se na instrução, pelo seu depoimento se depreende que ela quer que o autor do fato seja punido, estes atos, por si só, podem ser considerados como representação, uma vez que esta é informal. Assim, o juiz julgará sem ouvir a vítima, justificando que dos atos por ela anteriormente praticados, pôde retirar sua vontade.

Observa-se, contudo, que embora informal, a manifestação de vontade da vítima tem que ser inequívoca, se houver dúvidas, deverá ser ela intimada.

Pode ocorrer que a vítima, ao ser ouvida, apenas relatou os fatos, sem demonstrar qualquer interesse na sua apuração, não sendo possível descobrir qual é sua vontade, imprescindível será que seja intimada. Só após a representação poderá o magistrado julgar, condenando ou absolvendo.

Outra possibilidade, é a vítima ter expressado seu desejo de não prosseguir com o processo, pois já está em paz com seu agressor. Fato comum de acontecer em brigas entre cônjuges. Restará ao juiz, somente, declarar extinta a punibilidade.

Assim, o juiz presidente deve analisar os autos buscando retirar dos atos anteriormente praticados qual o desejo da vítima. Caso não seja possível, o julgamento há de ser convertido em diligências, a fim da vítima ser intimada e poder manifestar sua vontade. E se a mesma não for encontrada? Os autos deverão permanecer em cartório até que a punibilidade esteja extinta pela prescrição. Pode ocorrer, ainda, que a vítima tenha falecido por outra causa, neste caso o direito de representação poderá ser exercido pelo seu cônjuge, ascendentes, descendentes ou irmãos, nos termos do art. 24 do Código de Processo Penal.

Intimada a vítima, o prazo para oferecer a representação é de seis meses, de acordo com os arts. 103 do CP e 38 do CPP. Não é aplicável, aqui, o art. 91 da Lei nº 9.099/95, posto que se trata de uma norma de direito intertemporal, direcionada aos inquéritos e ações penais em andamento à época da promulgação da lei. A hipótese ora tratada pode acontecer em qualquer momento, não tendo nenhuma relação com direito intertemporal.

3. Quesitação e autodefesa

Constitui o interrogatório fonte dos questionários? Digamos que o réu sustente tese diversa da citada pelo advogado, por exemplo no interrogatório declara ter praticado o fato em legítima defesa e o seu patrono sustenta durante os debates o homicídio privilegiado pela violenta emoção. Deve ser quesitado o alegado pelo réu? Sustentamos que sim.

O julgamento pelo tribunal popular é realizado através de respostas aos quesitos, que são perguntas sobre o fato elaboradas pelo juiz presidente. Existem regras sobre a formulação dos quesitos, que devem ser obedecidas pelo magistrado, sob pena de nulidade (art. 564, III, "k" do CPP).

De acordo com o art. 484 do Código de Processo Penal: "se o réu apresentar, na sua defesa, ou alegar, nos debates, qualquer fato ou circunstância que por lei isente de pena ou exclua o crime ou o desclassifique, o juiz formulará os quesitos correspondentes, imediatamente depois dos relativos ao fato principal" (grifo nosso). Como se vê, não há uma faculdade do magistrado, nem tão pouco discricionariedade na escolha da tese a ser submetida aos jurados. O que existe é uma imposição legal de que, seja qual for ou quantas forem as teses, o juiz deve quesitá-las. A norma examinada, ainda, não condiciona em nenhum momento a formulação dos quesitos a requerimento da defesa. Assim, o juiz presidente, ao final dos debates, confeccionará os quesitos defensivos com base naqueles, bem como considerando o interrogatório do réu.

Não se pode esquecer que a Constituição da República, em seu art. 5º, inciso LV, consagra como garantia fundamental a ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes. A ampla defesa não se faz unicamente através do advogado, mas também pelo próprio réu. Assim, temos a defesa técnica e a autodefesa. A primeira feita por profissional habilitado, e a última pelo réu pessoalmente.

A autodefesa se exterioriza com a presença do réu durante a instrução criminal, fato que pode ser de grande valia para o advogado, uma vez que o réu pode sugerir perguntas a serem feitas, ele conhece as testemunhas, sabe como os fatos ocorreram. Vale a pena lembrar que o julgamento pelo tribunal leigo só poderá ser realizado com a presença do réu, salvo se tratar de crime afiançável (art. 451, § 1º, CPP). O auge da autodefesa consiste no interrogatório, é neste momento que o réu dará sua versão sobre os fatos, é nesta oportunidade que ele tentará convencer o juiz, ou no caso, os jurados da sua inocência.

Não pode a autodefesa ser ignorada no procedimento do júri. Note-se que o legislador constituinte, ao reconhecer a instituição do júri, assegurou a plenitude de defesa (art. 5º, XXXVIII, "a"). Se o alegado pelo réu não vai ser submetido à apreciação do Conselho de Sentença, qual o interesse de ouvi-lo? Digamos que os jurados se convençam de que o réu foi verdadeiro em suas declarações, de que adianta se não lhes for quesitado sobre isto?

Entendemos, assim, que a tese sustentada pelo réu quando do seu interrogatório, ainda que não defendida por seu advogado, ou até mesmo em conflito com as alegadas pelo mesmo, deve ser submetida à votação, cabendo ao juiz presidente, de ofício, incluí-las na quesitação.

4. Recurso cabível da decisão dos jurados que nega atenuante existente e provada

Os jurados, após responderem positivamente aos quesitos relacionados à acusação, passam a votar o quesito obrigatório — se há atenuantes em favor do réu. Digamos, por exemplo, ser o réu menor de 21 anos, fato comprovado através de sua certidão de nascimento. O Conselho de Sentença, seguindo o afã condenatório, responde negativamente ao quesito obrigatório. Ou seja, entendem os jurados que o réu era maior de 21 anos. O juiz presidente, ao prolatar a sentença condenatória, não reconhece a atenuante. Qual o recurso cabível?

Ser o agente menor de 21 anos na data do fato constitui circunstância que sempre atenua a pena, nos termos do art. 65, I, do Código Penal.

Embora sejam muitos os recursos previstos no âmbito criminal, entendemos que o mais adequado ao caso é o de apelo. O art. 593 do Código de Processo Penal estabelece os casos em que será cabível a apelação, estando no seu inc. III as hipóteses relativas às decisões do Tribunal do Júri. Vejamos!

As duas primeiras situações previstas em nada se relacionam com o fato ora estudado (art. 593, III, "a" e "b"). A alínea "c" do mesmo dispositivo prevê o caso de haver erro ou injustiça no tocante à aplicação da pena. Ora, o juiz presidente, no momento da sentença, respeitou o veredito. Como, aliás, determina a Constituição em seu art. 5º, XXXVIII, "c".

Já a alínea "d" do art. 593, III, preleciona que será cabível a apelação quando a decisão dos jurados for manifestamente contrária à prova dos autos. Destina-se às questões fáticas, relacionadas ao mérito do processo. O fato do réu ser ou não menor de 21 anos certamente não é a matéria sub judice.

Como se vê, o caso ora tratado não se adequa perfeitamente a nenhuma das hipóteses previstas no art. 593. Mas, observando os princípios do duplo grau de jurisdição, da ampla defesa, bem como o da instrumentalidade das formas, sustentamos ser a alínea "d" a que mais se aproxima, uma vez que, embora não seja sobre o mérito da causa, a decisão foi contrária à prova dos autos, ou seja, negou o que está claro e inconteste na certidão de nascimento.

5. Conclusões

a) Desclassificado o crime, pelo Tribunal do Júri, para lesões corporais leves, deve o juiz presidente retirar dos atos anteriormente praticados a vontade da vítima. Caso não seja possível identificá-la, necessário se faz sua intimação.

b) A tese sustentada pelo réu, no seu interrogatório, deve ser objeto de quesitação, cabendo ao juiz presidente, de ofício, sua elaboração.

c) Cabe apelação, com base no art. 593, III, "d", do Código de Processo Penal, da decisão dos jurados que nega atenuante comprovada nos autos.

Carla Rodrigues de Araújo
Promotora de justiça e professora de Direito Processual Penal da Fundação Escola do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e da Universidade Veiga de Almeida.

Quando cabe tentativa de homicídio?

A tentativa ocorre quando, não obstante praticados os atos de execução para a ocorrência da morte, ela não advém “... Por circunstâncias alheias à vontade do agente.” (artigo 14, inciso II, do Código Penal). Um simples exemplo disso é o da vítima que sobrevive depois de alvejada por disparos de arma de fogo.

Quando ocorre a tentativa?

A tentativa (conatus), prevista no art. 14, inciso II do Código Penal, ocorre quando, iniciada uma conduta, o delito não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Quais são os elementos da tentativa?

Para que haja a tentativa, são necessári- os dois elementos: 1º) atos de execução 2º) não-consumação do crime por cir- cunstâncias alheias à vontade do agente. Esses elementos estão espelhados no art.

Qual é a pena para tentativa de homicídio simples?

Art 121. Matar alguem: Pena – reclusão, de seis a vinte anos.

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