Como você pode atuar para ilidir os efeitos do não comparecimento à audiência inaugural?

Como você pode atuar para ilidir os efeitos do não comparecimento à audiência inaugural?

Coordenação: Ricardo Calcini.

Inicialmente, insta ressaltar alguns institutos que se assemelham, mas não se confundem [1]. A contumácia é a inércia das partes no seu ônus de praticar determinado ato processual – como exemplo dos efeitos desse instituto temos o artigo 11-A da CLT (acrescido pela reforma trabalhista), que prevê a prescrição intercorrente [2].

Já a revelia, espécie de contumácia, é a omissão do réu, e somente desse, no seu ônus processual de defesa ao pedido formulado pelo autor na inicial. No processo do trabalho, o momento do seu surgimento não é pacífico. Há o entendimento de que a revelia ocorre ante a mera ausência do réu na audiência inaugural, fundamentado no artigo 844, caput, da CLT [3]. De outro modo, há quem entenda que a mera ausência de contestação, conforme artigo 344 do CPC [4], aplicável a seara trabalhista, já configura a revelia, pois a apresentação contestatória é o que demonstra a vontade do reclamado em defender-se das alegações do reclamante.

A revelia, seja a decorrente da ausência do réu em audiência inicial; seja a ausência de sua defesa, possui duas modalidades de efeitos, qual sejam: material e processual.
O efeito material da revelia se traduz na presunção de veracidade das alegações fáticas trazidas pela reclamatória. Trata-se, contudo, de presunção relativa, pois a confissão é ficta: apesar do reclamado não ter direito de produzir novas provas (o que não constitui cerceamento de defesa) [5], pode ser ilidida por prova em contrário, já existente nos autos, ou a serem produzidas por determinação do juízo [6]. Nesse sentido, vejamos Súmula 74, itens II e III do TST, in verbis:

II – A prova pré-constituída nos autos pode ser levada em conta para confronto com a confissão ficta (arts. 442 e 443, do CPC de 2015 – art. 400, I, do CPC de 1973), não implicando cerceamento de defesa o indeferimento de provas posteriores.
III- A vedação à produção de prova posterior pela parte confessa somente a ela se aplica, não afetando o exercício, pelo magistrado, do poder/dever de conduzir o processo.

Quanto aos efeitos processuais, são eles: julgamento antecipado do mérito, se não houver necessidade probatória; e prescindibilidade de intimação do réu, sem procurador constituído nos autos, dos demais atos do processo, com a ressalva de, no processo do trabalho, ser obrigatória a intimação do réu revel acerca da sentença [7].

Antes da Lei 13.467/2017 (reforma trabalhista), já havia mitigação dos efeitos da revelia no processo do trabalho, por força do artigo 345 do CPC, aplicável a seara trabalhista, in verbis:
Art. 345. A revelia não produz o efeito mencionado no art. 344 se:

I – havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação;
II – o litígio versar sobre direitos indisponíveis;
III – a petição inicial não estiver acompanhada de instrumento que a lei considere indispensável à prova do ato;
IV – as alegações de fato formuladas pelo autor forem inverossímeis ou estiverem em contradição com prova constante dos autos.

Com o advento da reforma trabalhista, foi incluído o § 4º no artigo 844 da CLT, sem nenhuma novidade, eis que reproduz, de forma idêntica, o dispositivo do processo civil citado acima, ipsis litteris:

§ 4º. A revelia não produz o efeito mencionado no caput deste artigo se:
I – havendo pluralidade de reclamados, algum deles contestar a ação;
II – o litígio versar sobre direitos indisponíveis;
III – a petição inicial não estiver acompanhada de instrumento que a lei considere indispensável à prova do ato;
IV – as alegações de fato formuladas pelo reclamante forem inverossímeis ou estiverem em contradição com prova constante dos autos.

Em todo o caso, não há produção de efeitos materiais da revelia quando a lei exigir prova pericial, como é o caso dos pedidos de insalubridade e de periculosidade, por determinação expressa do artigo 195, § 2º da CLT [8].

Antes da reforma trabalhista, o Tribunal Superior do Trabalho vinha fazendo uma interpretação literal do art. 844, caput, da CLT, com entendimento, sumulado, de que o empregador deveria necessariamente apresentar-se pessoalmente, ou por meio de gerente ou preposto, em audiência para que não se configurasse a revelia e, por conseguinte, os seus efeitos. Vejamos o disposto na Súmula nº 122 do TST, in verbis:

A reclamada, ausente à audiência em que deveria apresentar defesa, é revel, ainda que presente seu advogado munido de procuração, podendo ser ilidida a revelia mediante a apresentação de atestado médico, que deverá declarar, expressamente, a impossibilidade de locomoção do empregador ou do seu preposto no dia da audiência.

Até então, era cristalizada a concepção de que, sendo a contestação um ato personalíssimo, exclusivo da parte, deveria ser realizado pela própria, em audiência – uma vez que a defesa trabalhista não é apresentada em secretaria, mas no momento da audiência, inaugural ou una.

Em outra visão, a reforma trabalhista acrescentou o § 5º ao artigo 844 da CLT:

Ainda que ausente o reclamado, presente o advogado na audiência, serão aceitos a contestação e os documentos eventualmente apresentados.

De certo, o legislador, nesse momento, prestigiou o reclamando que, ainda que ausente, contratou um advogado para comparecer à audiência e muniu-se de defesa e de documentação pertinente ao caso. Abre-se, todavia, alguns questionamentos acerca da intenção do § 5º, já que não há uma determinação expressa quanto a configuração ou não da revelia nesse caso, mas, tão somente, exclui um dos seus efeitos. A nova regra altera a configuração da revelia no processo do trabalho ou apenas mitiga ainda mais os seus efeitos?

Será necessária a interpretação jurisprudencial acerca dos efeitos e dos limites da análise judicial da contestação e documentos apresentados pelo reclamado ausente, mas com procurador constituído. Em todo caso, diante das novas disposições trazidas pela reforma, defendemos que a referida Súmula 122 do TST deve ser revogada, por ir de encontro ao novo texto legal.


Referências
[1] GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. 9 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
[2] Art. 11-A da CLT. Ocorre a prescrição intercorrente no processo do trabalho no prazo de dois anos.
1º A fluência do prazo prescricional intercorrente inicia-se quando o exequente deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução.
2º A declaração da prescrição intercorrente pode ser requerida ou declarada de ofício em qualquer grau de jurisdição.
[3] Art. 844 da CLT. O não-comparecimento do reclamante à audiência importa o arquivamento da reclamação, e o não-comparecimento do reclamado importa revelia, além de confissão quanto à matéria de fato.
[4] Art. 344 do CPC. Se o réu não contestar a ação, será considerado revel e presumir-se-ão verdadeiras as alegações de fato formuladas pelo autor.
[5] REVELIA. CONFISSÃO FICTA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. Não é causa de nulidade processual por cerceamento de defesa a declaração de revelia e consequente confissão ficta da parte que chega atrasada à audiência por motivo de desconhecimento de localização da Vara do Trabalho onde deveria comparecer à audiência, no horário e dia marcados no mandado de citação. (TRT-12 – RO: 00671200801512000 SC, Relator Dr. Edson Mendes de Oliveira, Secretaria da 2ª Turma, Publicação em 18/05/2009)
NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. REVELIA. CONFISSÃO FICTA. O indeferimento de oitiva de testemunhas, quando incontroversos os fatos pela incidência da confissão ficta, não implica cerceio de defesa. Recurso de Revista parcialmente conhecido e não provido. (TST – RR: 6696717720005035555, Relator Dr. Georgenor de SOUZA Franco Filho, 1ª Turma, Publicação em 22/11/2002)
[6] Art. 349 do CPC. Ao réu revel será lícita a produção de provas, contrapostas às alegações do autor, desde que se faça representar nos autos a tempo de praticar os atos processuais indispensáveis a essa produção.
Art. 370 do CPC. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.
[7] Art. 355, do CPC. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando:
I – não houver necessidade de produção de outras provas.
Art. Art. 852 – Da decisão serão os litigantes notificados, pessoalmente, ou por seu representante, na própria audiência. No caso de revelia, a notificação far-se-á pela forma estabelecida no § 1º do art. 841.
[8] Art. 195, § 2º da CLT. Arguida em juízo insalubridade ou periculosidade, seja por empregado, seja por Sindicato em favor de grupo de associado, o juiz designará perito habilitado na forma deste artigo, e, onde não houver, requisitará perícia ao órgão competente do Ministério do Trabalho.
[9] CASSAR, Vólia Bomfim. BORGES, Leonardo Dias. Comentários à reforma trabalhista. 1 ed. São Paulo: Método, 2017
[10] SCHIAVI, Mauro. A reforma trabalhista e o processo do trabalho: aspectos processuais da Lei 13.467/2017. 1ed. São Paulo: LTr, 2017

Como você pode atuar para ilidir os efeitos do não comparecimento à audiência inaugural?

Fabiana Almeida

Advogada trabalhista graduada na Universidade Federal Fluminense (UFF), pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pelo IBMEC/RJ e pós-graduanda em Direito Empresarial do Trabalho pela FGV/RJ. Foi membro da Comissão OAB Mulher da Seccional do Rio de Janeiro. Articulista de temas trabalhistas.

Publicidade

Qual a consequência para o não comparecimento do preposto na audiência inaugural?

A ausência do preposto à audiência inaugural conduz à revelia e confissão da reclamada quanto à matéria de fato, ainda que presente seu advogado (art. 844 da CLT c/c a Súmula nº 122 /TST).

Quais são as consequências para o reclamante do seu não comparecimento à audiência?

Art. 844 - O não-comparecimento do reclamante à audiência importa o arquivamento da reclamação, e o não-comparecimento do reclamado importa revelia, além de confissão quanto à matéria de fato.

Quais as consequências jurídicas se as partes não comparecem a audiência inicial e também a audiência de instrução?

§ 8º O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.

Quais são os casos em que a revelia não produz efeitos?

Não se produzem os efeitos da revelia, ainda, (a) ao réu preso revel ou ao réu revel que tiver sido citado por edital ou hora certa, casos em que lhe será nomeado curador especial, nos termos do art. 72, II, do CPC; (b) quando, sendo revel o assistido, o assistente apresentar contestação no prazo legal (art.