Foi a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvol- vimento, realizada no Rio de Janeiro, em junho de 1992. Também conhecida como Cúpula da
Terra, ela reuniu mais de 100 chefes de Estado para debater formas de desenvolvimento sustentável, um conceito relativamente novo à época. “O primeiro uso do termo é de 1987, norelatório Brundtland, feito pela ONU. Esse documento norteou as discussões sobre um modelo de crescimento econômico menos consumista e mais preocupado com questões ambientais”, explica o geógrafo Fábio Piccinato. As bases para a confe- rência de 1992 já eram discutidas desde 1972, quando a ONU organizou uma confe- rência
em Estocolmo, na Suécia. Ateve tanta visibilidade e adesão de países que a reunião seguinte, em Joanesburgo, na África do Sul, foi apelidada de Rio+10. Entre 13 e 22 de junho deste ano, a Cidade Maravilhosa vai sediar a Rio+20. O objetivo do encontro é verificar se houve avanços em relação às cúpulas anteriores e o que ainda precisa ser feito para que os países sejam, de fato, sustentáveis. COMPROMiSSO FiRMADO A Agenda 21 é um documento criado na Eco-92 que propõe
práticas e técnicas de desenvolvimento sustentável para nações, estados e cidades. Confira em abr.io/agenda21. PAPO CARIOCA Alguns temas atuais discutidos desde a Eco-92 Clima A preocupação com o aquecimento global vem desde os anos 70, mas foi intensificada na Eco-92. A qualidade do ar também foi discutida. Os debates foram base, inclusive, para a
criação, em 1997, do Protocolo de Kyoto, resolução de vários países que visa reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa Continua após a publicidade Água O Dia Mundial da Água, celebrado em 22 de março, foi fruto de discussões na Eco-92 sobre a importância da preservação dos recursos naturais. A água foi um dos recursos mais maltratados nos últimos 50 anos – o rio Tietê, que cruza quase todo o estado de São Paulo, por
exemplo, só passou a sofrer com a poluição nesse período Transporte alternativo Opções de locomoção para substituir os automóveis também foram discutidas na conferência. Isso levou alguns países a estimular o uso de bicicletas,que beneficiam o trânsito das cidades e diminuem a poluição. Nessa trilha também seguem os veículos movidos a eletricidade e a combustíveis renováveis Turismo ecológico Os debates também indicaram o potencial
econômico do ecoturismo, ou seja, atrair viajantes para conferir reservas naturais e manifestações culturais. De acordo com a ONU,o segmento cresce 30% ao ano atualmente. Com a Eco-92, as iniciativas de ecoturismo, à época restritas ao Canadá, ganharam o mundo Reciclagem Uma das resoluções da Eco-92 atentava para o desperdício crescente de alimentos, água e energia, ampliandoo descompasso entre o crescimento populacional e a oferta de recursos naturais. A reciclagem
minimiza esses efeitos ao reaproveitar materiais beneficiados como matéria-prima para novos produtos FONTES Fábio Piccinato, geógrafo especializado em meio ambiente; Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo; Ministério do Meio Ambiente Continua após a publicidade Foi a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvol- vimento, realizada no Rio de Janeiro, em junho de 1992. Também conhecida como Cúpula da Terra, ela reuniu mais de 100 chefes de Estado para debater formas de desenvolvimento sustentável, um conceito relativamente novo à época. “O primeiro uso do termo é […] Transforme sua curiosidade em conhecimento. Assine a Super e continue lendoLeia a edição de junho/22 da Revista E na íntegra LEGADO E DESAFIOS TRÊS DÉCADAS DEPOIS DA CONFERÊNCIA QUE COLOCOU A PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA PAUTA GLOBALHá exatamente 30 anos, a cidade do Rio de Janeiro preparava-se para receber um evento que até hoje é considerado um marco para a conservação do meio ambiente e adoção de outro modelo de desenvolvimento econômico. De 3 a 14 de junho de 1992, a capital fluminense foi sede da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, que ficou conhecida pelos nomes ECO-92, Rio-92 e Cúpula da Terra. Jornais, revistas, rádios e canais de televisão colocaram o termo “ecologia” em pauta, enquanto lideranças políticas dos cinco continentes, organizações não governamentais e intergovernamentais sentaram-se à mesa para discutir um modelo sustentável de desenvolvimento baseado na conservação dos recursos naturais do planeta. Hoje, três décadas depois, qual o legado da ECO-92 e quais desafios batem à nossa porta? Para onde precisamos caminhar nos próximos 30 anos? Renomado climatologista e um dos cientistas brasileiros mais conhecidos mundialmente, Carlos Nobre esteve presente na Rio-92, onde apresentou dados preliminares de um experimento realizado na Floresta Amazônica. Feito em cooperação com a Inglaterra, o estudo Abracos (em inglês, Anglo-Brazilian Amazonian Climate Observation Study) teve início em 1990 e foi concluído em 1996. “Ali, em 1992, eu tive a oportunidade de apresentar resultados iniciais, mostrando como a floresta interage com o sistema climático, com a atmosfera, e os efeitos quando se desmata a floresta para criar pastagens”, recorda Nobre, que foi presidente do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas e foi nomeado, em maio deste ano, membro da Royal Society, uma das academias de ciência mais tradicionais no mundo – o climatologista é primeiro brasileiro a ser convidado a ingressar na instituição criada em 1660, com sede em Londres. “Naquele experimento, vimos a capacidade impressionante da floresta de reciclar água. Durante a estação seca, a floresta continuava a transpirar água o tempo todo, enquanto a pastagem não. Além disso, a temperatura aumentava mais nas pastagens. Nós também já estávamos fazendo medidas do fluxo de gás carbônico: constatamos que a pastagem contribuía para emissão de gases de efeito estufa, enquanto a floresta é o que chamamos de sumidouro de carbono, contribuindo para retirada de gás carbônico da atmosfera”, conta (leia Entrevista publicada na Revista E nº 296, de junho de 2021). Para o climatologista, o crescente interesse da ciência em estudar os impactos humanos sobre o meio ambiente é um dos frutos da ECO-92. “Foram constituídos grupos de trabalhos científicos, principalmente na questão das mudanças climáticas e da proteção à biodiversidade. Então, a ciência tem avançado muito nessas áreas e vem mostrando os crescentes riscos de não combatermos as mudanças climáticas e de não protegermos a biodiversidade. Inclusive, as mudanças climáticas são uma grande ameaça à biodiversidade, afetada pelo desmatamento, degradação, fogo e poluição”, ressalta. Somado ao interesse da comunidade científica, houve ainda um maior envolvimento do setor de inovações tecnológicas em resposta à preocupação com a degradação do meio ambiente, segundo Carlos Nobre. “Nós produzimos, nesses últimos 30 anos, inúmeras soluções. Por exemplo, mais de 70% das emissões globais ainda são provocadas pela queima de combustíveis fósseis – carvão, petróleo e gás natural –, mas, hoje, a tecnologia de energias renováveis é totalmente viável, pode ser escalável globalmente e é muito mais barata. Outra solução é a agricultura moderna regenerativa na contramão da monocultura, que provoca desmatamento e destruição de biomas. Infelizmente, a velocidade com que essas soluções são implementadas no dia a dia do planeta é insuficiente. Essa é a grande preocupação global e da comunidade científica”, acrescenta o cientista, que é proponente do Amazônia 4.0 – projeto que busca demonstrar a viabilidade de uma nova bioeconomia de floresta em pé e rios fluindo para a Amazônia, incorporando conhecimento científico e inovações tecnológicas com conhecimentos de povos indígenas e comunidades locais. O climatologista Carlos Nobre esteve presente na ECO-92, onde já alertava para os impactos provocados pelo desmatamento da Amazônia. Foto: Leticia Valverde/SilverbackOutra herança da ECO-92 são pactos e acordos que reverberam até hoje. “Esta conferência nos deixou uma riqueza de legados como os três dos mais importantes marcos internacionais sobre desenvolvimento sustentável e meio ambiente: a Convenção-Quadro sobre Mudança do Clima, a Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB) e a Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca. Além dessas convenções, a Declaração do Rio e a Agenda 21 (Leia o boxe Marcos Temporais) foram essenciais para a consolidação do conceito de ‘desenvolvimento sustentável’ e ainda são referências para as principais negociações internacionais”, destaca Alexandre Prado, diretor de economia verde da organização não governamental WWF-Brasil. Segundo Prado, a manifestação da sociedade civil foi outro legado da ECO-92. “O então chamado Fórum Global Paralelo, das ONGs, no Aterro do Flamengo juntou diversas tribos da sociedade civil planetária que mostravam sua cara na primeira conferência global de meio ambiente. A sociedade civil se organizou, participou e influenciou o processo, mudando para sempre o formato das conferências da ONU que passaram, a partir dali, a envolver os chamados major groups, segmentos relevantes a serem envolvidos nas discussões e pactuações”, complementa. FUTURO NO PRESENTE Em 1992, o engenheiro florestal Pablo Hoffmann era um adolescente e já acompanhava pela televisão a preocupação global com o meio ambiente. “A bem da verdade, ainda éramos muito jovens à época, tínhamos 14 ou 15 anos, mas sabíamos que algo de interessante estava acontecendo, pois o evento teve muita publicidade”, relembra Hoffmann que, ao cursar a faculdade de Engenharia Florestal na Universidade Federal do Paraná (UFPR), também se dedicaria à preservação da biodiversidade, mais precisamente à preservação de florestas de araucárias no Sul do Brasil. Foi na universidade que ele desenvolveu, junto a outros amigos, o projeto que daria origem à Sociedade Chauá. Hoje, a organização não governamental mantém um viveiro com mais de 215 espécies de plantas nativas da Floresta com Araucárias, sendo 80 espécies raras ou ameaçadas de extinção. Diretor executivo da instituição, em abril deste ano, Hoffmann recebeu o Whitley Awards, prêmio concedido anualmente pela fundação britânica homônima a seis líderes conservacionistas da Ásia, África e América Latina. “Um tempo depois da ECO-92, pudemos entender que aquele momento foi um marco para vários temas voltados à conservação da natureza. A partir daquele evento, muitas outras ações surgiram e foram sendo ampliadas, culminando em muitas das estratégias e iniciativas globais de proteção dos recursos naturais que temos hoje”, destaca o engenheiro florestal. Dedicada à preservação de florestas de araucárias na Região Sul, a Sociedade Chauá soma-se a outros institutos sem fins lucrativos que são frutos da Cúpula da Terra. Foto: Sociedade Chauá Brazil/Araucaria ForestGerações seguintes às de Pablo Hoffmann seguem demonstrando engajamento e compromisso ambiental. São filhos e netos da ECO-92 que carregam nas mãos a possibilidade de mudanças efetivas, segundo o climatologista Carlos Nobre. “Infelizmente, a minha geração não entregou um mundo sustentável para a geração da Greta Thunberg [ativista ambiental sueca de 19 anos, reconhecida como uma das vozes da nova geração pela preservação do meio ambiente], que já tem uma percepção muito clara dos riscos que o planeta corre”, observa. Formada em Relações Internacionais, a jovem embaixadora da ONU Amanda Costa faz parte dessa geração com menos de 30 anos que realiza e participa de ações de mobilização de outros jovens para construírem um mundo inclusivo, colaborativo e sustentável. “Eu sou uma mulher preta de periferia e percebi que a crise climática está impactando a galera de quebrada e nós não estamos nos espaços de poder. Também percebi que existem organizações multilaterais que estão dialogando sobre isso, mas poucas vezes esse assunto chega na quebrada. Quando eu percebi essa lógica, decidi que queria ser uma porta-voz da minha comunidade, da juventude brasileira preta e periférica e quero ser porta-voz de um novo modelo de vida”, explica. Movida pelo objetivo de ampliar o debate sobre a crise climática, Amanda e outras jovens criaram o Perifa Sustentável, instituto que promove ações e elabora projetos que reivindicam a democratização e a representatividade da juventude para justiça racial e ambiental nos locais de tomada de decisão. “A Rio-92 foi um marco, porque nos mostrou que a gente precisa desenvolver políticas, estratégias e soluções para contemplar a sustentabilidade dentro desse projeto de futuro”, analisa. Presente nas redes sociais e outras plataformas digitais compartilhando informações e ações para as quais é convidada a participar dentro e fora do Brasil, Amanda acredita que sua geração é fruto de todo um caminho trilhado, há mais de 30 anos. “Se eu estou aqui hoje, atuando como ativista climática, se hoje eu sou conselheira do Pacto Global da ONU, é porque antes pessoas criaram esse caminho com muita luta e determinação para que a gente pudesse, de fato, chacoalhar a sociedade e mostrar que não vai ter desenvolvimento se ele não for sustentável, se não diminuírem as desigualdades sociais, se não houver uma economia inclusiva ao mesmo tempo em que somos ambientalmente responsáveis”, conclui. A jovem embaixadora da ONU Amanda Costa, moradora da Brasilândia, Zona Norte de São Paulo, faz parte de uma nova geração de ativistas que atuam em mobilizações pela conservação do meio ambiente e por um modelo de desenvolvimento sustentável. Foto: Ivan PachecoPRIMAVERA SILENCIOSAImagine uma primavera sem o som de pássaros e de insetos polinizadores responsáveis pela estação mais florida do ano? A hipótese foi lançada há 60 anos no livro Primavera Silenciosa, da bióloga estadunidense Rachel Carson (1907-1964). Reconhecida como a primeira publicação a alertar a sociedade para os malefícios dos agrotóxicos, a obra é resultado da compilação de estudos realizados pela cientista em 1962 (mesmo ano do lançamento do livro) e que logo se tornou um best-seller. Ao chocar a sociedade da época, o livro ainda provocou uma grande repercussão no cenário político. O então presidente dos Estados Unidos, John Kennedy, abriu uma comissão para apurar as sérias conclusões tiradas por Carson sobre os efeitos nocivos de pesticidas à saúde humana e de outras espécies da fauna e da flora. Apesar de ter sido contestada, criticada e ter sofrido ataques, Carson teve seu trabalho levado adiante. Em 1972, o governo finalmente baniu nos Estados Unidos o composto químico DDT (diclorodifeniltricloroetano) – primeiro pesticida moderno largamente usado durante e após a Segunda Guerra Mundial – e o trabalho de Rachel Carson conduziu à primeira grande campanha contra o uso de agrotóxicos, despertando cidadãos e governos em todos os continentes para as causas ambientais. Rachel Carson em 1940. Foto: U.S. Fish and Wildlife Service/Dom. PúblicoMARCOS TEMPORAIS
|