Porque a tuberculose se caracteriza pela presença de um granuloma?


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Inflamação Granulomatosa
13/11/2012
Publicado por: Flora Cruz de Almeida

Texto de Caio Mayrink

Inflamação Granulomatosa                                                                                                           

A inflamação granulomatosa, ou inflamação crônica específica, é uma apresentação distinta de inflamação crônica, apresentada em casos de agentes agressores difíceis de serem erradicados. Ela é caracterizada pela formação de granulomas, que nada mais são do que uma aglomeração de células de defesa na tentativa de conter o agente agressor.

Morfologia do granuloma

Os granulomas se caracterizam pela presença de uma agregação de macrófagos morfologicamente alterados, eosinofílicos, adquirindo formato achatado e com os limites intercelulares pouco evidentes, sendo assim chamados de celulas epitelioides. Muitas vezes as células epitelioides se fundem formando células gigantes de corpo estranho ou células gigantes de Langhans. Essas células multinucleadas diferenciam-se pela disposição de seus núcleos no citoplasma. Enquanto células de Langhans apresentam núcleos dispostos perifericamente, as de corpo estranho têm seus núcleos desorganizados. O agregado de macrófagos é rodeado por um anel de leucócitos mononucleados – linfócitos em sua maioria. Nos casos de granulomas mais velhos, evidencia-se a formação de uma camada fibrosa mais externa, composta por fibroblastos e tecido conjuntivo.

Tipos de granuloma

Tomando como base a patogênese, existem dois tipos de granulomas. O granuloma de corpo estranho ocorre na presença de corpos estranhos relativamente inertes de difícil fagocitose, como fios de sutura. As células epitelioides e as de corpo estranho se acumulam ao redor do material estranho. O granuloma imune ocorre em alguns casos específicos, geralmente infecciosos. Geralmente o agente indutor do granuloma é dificilmente eliminável, ativando uma resposta imunológica mediada por linfócitos T CD4, principalmente TH1. Essa resposta imunológica recebe o nome de Hipersensibilidade do Tipo Tardia, ou inflamação imune.

Inflamação imune

Células apresentadoras de antígeno (APCs) fagocitam o agente agressor e apresentam peptídeos para linfócitos T CD4 naive (não diferenciados), que secretam IL-2 (interleucina 2), um fator de crescimento autócrino, causando proliferação de linfócitos T CD4. As APCs (macrófagos e células dendríticas) produzem quimiocinas responsáveis pela diferenciação dos linfócitos T CD4 naive em linfócitos TH1 e TH17. Os linfócitos TH1 produzem IFN-γ (interferon gama), funcionando também como um fator de crescimento autócrino. O IFN- γ também age nos macrófagos aumentando sua capacidade de fagocitose e de matar microorganismos. Os macrófagos ativados produzem diversas citocinas pró-inflamatórias, como TNF (fator de necrose tumoral) e IL-1, e IL-12, responsável pela ativação de linfócitos TH1. Os linfócitos TH17 são ativados em algumas infecções microbianas e em doenças autoimunes. Quando ativados, esses linfócitos produzem uma série de citocinas, como IL-17 e IL-22, recrutadoras de neutrófilos e monócitos. Concluindo-se, a reação de Hipersensibilidade Tardia caracteriza-se pelo acúmulo de leucócitos mononucleares (linfócitos CD4 e plasmócitos) e de macrófagos.

Doença granulomatosa

Doenças granulomatosas são caracterizadas pela formação de granulomas. São exemplos de granulomatoses:

Granulomas hepáticos podem ter várias causas e são, geralmente, assintomáticos. Entretanto, a doença que leva ao granuloma pode, eventualmente, produzir manifestações extra-hepáticas e/ou processo inflamatório hepático, fibrose e hipertensão portal. O diagnóstico baseia-se em biópsia hepática, mas esta é indicada apenas nos casos em que há suspeita de causa tratável (p. ex., infecções) ou em que outras causas hepáticas já tenham sido descartadas. O tratamento é dirigido à doença de base.

Os granulomas hepáticos, ainda que sejam geralmenteinsignificantes, podem com frequência refletir doença de certo significado clínico. O termo hepatite granulomatosa é utilizado com alguma frequência para descrever uma condição em que, geralmente, não há uma verdadeira hepatite, pois a presença de granulomas não implica em infiltrado inflamatório hepatocelular.

Etiologia dos granulomas hepáticos

Os granulomas hepáticos têm muitas causas (ver tabela ); fármacos e doenças de ordem sistêmica (muitas vezes infecções) são mais comuns que distúrbios de origem primariamente hepática. Infecções devem ser identificadas porque exigem tratamentos específicos. Tuberculose e esquistossomose Esquistossomose Esquistossomose é a infecção causada por trematódeos sanguíneos do gênero Schistosoma, adquiridos transcutaneamente ao nadar ou entrar em contato com águas contaminadas. Os parasitas... leia mais são as causas infecciosas mais comuns no mundo; causas fúngicas e virais são menos comuns. Sarcoidose Sarcoidose A sarcoidose é uma doença inflamatória que resulta em granulomas sem caseificação em um ou mais órgãos e tecidos; a etiologia é desconhecida. Os pulmões e o sistema linfático são afetados com... leia mais

Porque a tuberculose se caracteriza pela presença de um granuloma?
é a causa não infecciosa mais comum; o fígado é envolvido em cerca de dois terços dos pacientes e, ocasionalmente, as manifestações clínicas da sarcoidose são predominantemente hepáticas.

Tabela

Porque a tuberculose se caracteriza pela presença de um granuloma?

Granulomas são muito menos comuns nas doenças hepáticas primárias; a colangite biliar primária Colangite biliar primária (CBP) Colangite biliar primária (CBP; antes conhecida como cirrose biliar primária) é uma doença hepática autoimune caracterizada pela destruição progressiva dos ductos biliares intra-hepáticos, provocando... leia mais (colangite biliar primária, anteriormente cirrose biliar primária) é a única causa importante. Pequenos granulomas aparecem em outras hepatopatias, mas sem significado clínico.

Hepatite granulomatosa idiopática é uma síndrome rara de granulomas hepáticos e febre recorrente, mialgia, astenia e outros sintomas de envolvimento sistêmico, que ocorrem de modo intermitente durante anos. Alguns especialistas acreditam tratar-se de variante da sarcoidose.

Fisiopatologia dos granulomas hepáticos

Um granuloma é uma coleção localizada de células inflamatórias crônicas, com a presença de células epitelioides e células gigantes multinucleadas. Pode haver necrose de caseificação ou reação do tipo corpo estranho (p. ex., ovos na esquistossomíase). A maioria dos granulomas ocorre no parênquima, mas os granulomas da colangite biliar primária Colangite biliar primária (CBP) Colangite biliar primária (CBP; antes conhecida como cirrose biliar primária) é uma doença hepática autoimune caracterizada pela destruição progressiva dos ductos biliares intra-hepáticos, provocando... leia mais podem se manifestar nas tríades hepáticas.

A formação de um granuloma não é completamente bem compreendida. Granulomas podem se desenvolver em resposta a irritantes endógenos ou exógenos com baixa solubilidade. Mecanismos imunológicia estão envolvidos.

Granulomas hepáticos raramente comprometem a função hepatocelular. Contudo, quando granulomas são parte de uma reação inflamatória mais ampla envolvendo o fígado (p. ex., reações a fármacos Lesão hepática provocada por fármacos Muitos fármacos (p. ex., estatinas) frequentemente causam elevações assintomáticas nas enzimas hepáticas [aspartato aminotransferase (AST), alanina aminotransferase (ALT), fosfatase alcalina]... leia mais , mononucleose infecciosa Mononucleose infecciosa A mononucleose infecciosa é causada pelo vírus Epstein-Barr (herpes-vírus humano tipo 4) e caracteriza-se por fadiga, febre, faringite e linfadenopatia. A fadiga pode persistir durante semanas... leia mais

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), pode haver disfunção hepatocelular. Às vezes, essa inflamação causa fibrose hepática Fibrose hepática Fibrose hepática é uma cicatrização exuberante em que excesso de tecido conjuntivo acumula-se no fígado. A matriz extracelular pode estar com produção excessiva, ou degradação deficiente, ou... leia mais progressiva e hipertensão portal Hipertensão Portal A hipertensão portal é a elevação da pressão na veia portal. Ela é causada mais frequentemente por cirrose (em países desenvolvidos), por esquistossomíase (em áreas endêmicas) ou por alterações... leia mais , o que ocorre de forma típica na esquistossomíase Esquistossomose Esquistossomose é a infecção causada por trematódeos sanguíneos do gênero Schistosoma, adquiridos transcutaneamente ao nadar ou entrar em contato com águas contaminadas. Os parasitas... leia mais e, ocasionalmente, na infiltração extensa da sarcoidose.

Sinais e sintomas dos granulomas hepáticos

Os granulomas propriamente ditos são normalmente assintomáticos; mesmo uma extensa infiltração geralmente produz apenas discretas hepatomegalias e pouca ou nenhuma icterícia. Os sintomas, caso ocorram, refletem a causa subjacente (p. ex., sintomas constitucionais em infecções, hepatosplenomegalia em esquistossomíase).

Causas dos granulomas hepáticos

  • Testes hepáticos

  • Exames de imagem

  • Biópsia

Granulomas hepáticos são suspeitados em pacientes com

  • Condições que frequentemente causem granulomas.

  • Massas inexplicadas encontradas durante exames de imagem.

  • Anormalidades detectadas por meio de um teste de imagem que é feito para avaliar elevações assintomáticas nas enzimas hepáticas, em particular a fosfatase alcalina.

Quando se suspeita de granulomas hepáticos, geralmente são feitos testes hepáticos Exames laboratoriais para fígado e da vesícula biliar Os exames laboratoriais geralmente são eficazes em: Detecção de disfunção hepáticas. Determinação da gravidade da doença. Monitorar a evolução de doenças hepáticas e a resposta ao tratamento... leia mais , mas os resultados são inespecíficos e raramente são úteis no diagnóstico. Fosfatase alcalina (e gama-glutamiltransferase) está, muitas vezes, pouco elevada, mas, ocasionalmente, pode apresentar grandes elevações. Outros resultados podem ser normais ou revelar anormalidades adicionais que, em última análise, refletem danos hepáticos (p. ex., hepatopatia por fármaco causando reação inflamatória generalizada no fígado). Em geral, exames de imagem Exames de imagem do fígado e da vesícula biliar Exames de imagem são essenciais para diagnosticar com precisão as doenças do trato biliar e são importantes para detectar lesões hepáticas focais (p. ex., abscessos, tumores). Eles são limitados... leia mais

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, como ultrassonografia, tomografia computadoriza e RM, não são diagnósticos; podem mostrar calcificações (se os granulomas são de longa duração) ou defeitos de preenchimento, particularmente no caso de lesões confluentes. Na sarcoidose Sarcoidose A sarcoidose é uma doença inflamatória que resulta em granulomas sem caseificação em um ou mais órgãos e tecidos; a etiologia é desconhecida. Os pulmões e o sistema linfático são afetados com... leia mais
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, os granulomas parecem hipodensos nas imagens transversais e, portanto, podem ser diagnosticados erroneamente como metástases hepáticas.

O diagnóstico baseia-se na biópsia hepática Biópsia hepática A biópsia hepática fornece informações histológicas sobre a estrutura do fígado e evidências de lesões a este (tipo e grau, bem como a presença ou não de fibrose); esta informação pode ser essencial... leia mais . Entretanto, biópsia é geralmenteindicada para diagnosticar causas tratáveis (p. ex., infecções) ou para diferenciar de doenças não granulomatosas (p. ex., hepatites crônicas virais Causas da hepatite Hepatite é uma inflamação do fígado caracterizada por necrose difusa ou irregular. A hepatite pode ser aguda ou crônica (geralmente definida como duração de > 6 meses). A maioria dos casos de... leia mais ). A biópsia, muitas vezes, revela a incidência de causas específicas (p. ex., ovos na esquistossomíase, necrose caseosa na tuberculose, fungos). Ainda assim, outros testes (p. ex., culturas, reações intradérmicas, exames de laboratório, radiografias, outras amostras de tecido) são frequentemente necessários.

Em pacientes com sintomas constitucionais ou de outra ordem que sugiram infecção (p. ex., febre de origem desconhecida Febre de origem indeterminada (FOI) Febre de origem desconhecida é a temperatura corporal ≥ 38,3° C retalmente e que não é decorrente de doença transitória e autolimitada, de doença rapidamente fatal, ou de doenças com claros... leia mais ), tomam-se medidas específicas, de forma a aumentar a sensibilidade da biópsia (p. ex., mandar parte do fragmento para exame “a fresco”, como culturas, e também a utilização de colorações específicas para bacilos álcool-ácido resistentes, fungos e outros agentes). Com frequência, a causa não é estabelecida.

Prognóstico para granulomas hepáticos

Granulomas hepáticos causados por fármacos ou infecções regridem completamente após o tratamento. Granulomas da sarcoidose podem desaparecer de maneira espontânea ou persistir por anos, geralmente sem doença hepática clinicamente importante. Fibrose progressiva e hipertensão portal raramente se desenvolvem (cirrose da sarcoidose).

Na esquistossomíase Esquistossomose Esquistossomose é a infecção causada por trematódeos sanguíneos do gênero Schistosoma, adquiridos transcutaneamente ao nadar ou entrar em contato com águas contaminadas. Os parasitas... leia mais , a fibrose portal progressiva é típica (fibrose em cachimbo); a função hepática é normalmente conservada, mas podem ocorrer esplenomegalia importante e hemorragia por varizes.

Tratamento dos granulomas hepáticos

  • Tratamento da causa

O tratamento é direcionado à doença subjacente. Quando a causa é desconhecida, geralmente, suspende-se o tratamento e institui-se acompanhamento com testes hepáticos periódicos. No entanto, se ocorrem sintomas de tuberculose (p. ex., febre prolongada) e de deterioração da saúde, terapia empírica para tuberculose pode estar justificada.

Corticoides podem resolver anormalidades bioquímicas hepáticas e manifestações sistêmicas da sarcoidose como perda ponderal e envolvimento extra-hepático; entretanto, eles não previnem a fibrose hepática Fibrose hepática Fibrose hepática é uma cicatrização exuberante em que excesso de tecido conjuntivo acumula-se no fígado. A matriz extracelular pode estar com produção excessiva, ou degradação deficiente, ou... leia mais . Portanto, corticoides só são recomendados em pacientes com manifestações sistêmicas da sarcoidose Sarcoidose A sarcoidose é uma doença inflamatória que resulta em granulomas sem caseificação em um ou mais órgãos e tecidos; a etiologia é desconhecida. Os pulmões e o sistema linfático são afetados com... leia mais

Porque a tuberculose se caracteriza pela presença de um granuloma?
e apenas se tuberculose e outras infecções puderem ser excluídas com segurança.

Pontos-chave

  • Granulomas hepáticos podem resultar de muitos fármacos e distúrbios sistêmicos; doenças hepáticas primárias são causas incomuns.

  • Tuberculose e esquistossomose são as causas infecciosas mais comuns em todo o mundo; sarcoidose é a causa não infecciosa mais comum.

  • Os sintomas e as complicações decorrem em maior escala da condição subjacente do que dos próprios granulomas.

    O que é o granuloma na tuberculose?

    O granuloma tuberculoso, denominado de tubérculo, é caracterizado pela presença de necrose caseosa central, com infiltrado periférico de macrófagos modificados (células epitelióides e células gigantes), linfócitos, plasmócitos e fibroblastos (Fig. 4.1).

    Como se forma o granuloma na tuberculose?

    4.1 FORMAÇÃO DO GRANULOMA A forma secundária se desenvolve a partir de uma nova infecção ou da reativa- ção de bacilos latentes. Na infecção primária, o Mtb é inalado e após atingir os alvéolos, o bacilo é detectado e fagocitado por macrófagos alveolares (BOM- BARDA; FIGUEIREDO, 2001).

    Por que a tuberculose é chamada de uma doença granulomatosa?

    Tuberculose: causada pelo Mycobacterium tuberculose, um bacilo-álcool resistente, a doença gera uma reação tecidual formando um granuloma caseoso (tubérculo), que é um aglomerado de macrófagos ativados (celular epitelioides), rodeado de fibroblastos, linfócitos, histiócitos e necrose central com restos granulares ...

    Qual é a constituição de um granuloma tuberculose completo?

    O granuloma é formado por células gigantes, derivadas dos macrófagos, e por linfócitos T, que tentam conter a disseminação do BK. No miolo do granuloma maduro, observam-se células epitelióides e células gi- gantes de Langerhans e, em seu envoltório, linfócitos T CD4+ e CD8+.