Como o trabalho interdisciplinar na escola pode contribuir para o processo de ensino

Introducão

As transformações ocorridas na sociedade nas últimas décadas exigem reformulações constantes dos pressupostos, dos objetivos e das fundamentações, orientadores da área de Educação em geral e do Ensino de Ciências. A complexidade dos problemas atuais mobilizaram discursos referentes a orientações didáticas, caracterizados por uma plêiade de termos, como: formação para cidadania, ensino balizado em competências e habilidades e interdisciplinaridade. No entanto, para que a apropriação desses termos em contextos escolares seja efetiva e plausível, é necessário um aprofundamento epistemológico e empírico, uma reflexão acerca das possibilidades de uma incidência real neles, em articulação com uma prática pedagógica factível de ser entendida e realizada pelos professores atuantes no Ensino Médio. Para a construção de um trabalho interdisciplinar, por exemplo, faz-se necessário ir além de compilações teóricas descritas na literatura, mas propiciar a elaboração de atividades coletivas, que ultrapassem as especificações epistemológicas de cada disciplina, uma vez que se ancora em outros conteúdos curriculares, além dos conceituais.

Neste trabalho, procuramos indicar um caminho para o planejamento de uma atividade interdisciplinar cuja fundamentação esteja nos domínios epistêmicos do conhecimento (aqui desmembrados em linguagens e seus valores e habilidades cognitivas). Esses domínios estão descritos em uma tabela que deveria ser utilizada por todos os professores para elaboração e avaliação das atividades propostas em sala de aula.

A partir da utilização da tabela, descrevemos uma possibilidade de planejamento de um trabalho interdisciplinar, cuja estrutura aproxima-se da interdisciplinaridade escolar.

Educação científica contemporânea e o jargão da interdisciplinaridade: como evitar o discurso retórico dessa relação?

As bases epistemológicas, axiológicas e científicas do contexto contemporâneo reverberam sobre a prospecção de uma alfabetização científica que esteja além de caracterizações univocamente conceituais. Assim, os processos de ensino e aprendizagem, tal como sugere a referida prospecção, apontam para um saber mais lógico, vinculado a estratégias de formação para cidadania e para aquisição de conteúdos de natureza procedimental e atitudinal.

A necessária articulação entre a conjuntura social e os objetivos educacionais subjaz uma reflexão sobre as caracterizações dessa conjuntura e a incidência nas configurações da Educação Científica. Estamos diante da sociedade da informação, do conhecimento múltiplo e descentralizado e do aprendizado contínuo (Pozo & Crespo, 2009). Assim, os alunos precisam de capacidade para organizar, interpretar e dar sentido à informação, já fornecida por outros meios, para que tenham ferramentas cognitivas disponíveis enquanto elaboram esse exercício de transição e transposição do conhecimento às situações cotidianas (Pozo & Crespo, 2009).

Não se trata de entender que os alunos devam aprender um conjunto fixo de habilidades ou associá-las definitivamente à aprendizagem de determinados conteúdos científicos, mas de um exercício conjunto em que sejam possíveis a identificação e a relação entre os fenômenos com a sua discussão (Caldeira & Manechine, 2007). Assim, a aquisição de algumas habilidades em uma disciplina específica pode facilitar a aprendizagem em outras disciplinas, uma vez que o aluno passa a elaborar uma forma de pensar ou constrói estratégias de pensamento que podem ser fundamentais diante de diferentes situações, como, por exemplo, a interpretação de um gráfico - se ele sabe ler e interpretar um gráfico matemático, deverá saber ler e interpretar um gráfico na geografia, ou ainda da química, transpondo essa habilidade para contextos diferentes. Trata-se de entendermos que as habilidades subjacentes à aprendizagem podem ser trabalhadas no contexto de diferentes disciplinas: não há uma relação fixa entre determinada habilidade e determinada disciplina. Por exemplo, ler e interpretar não são habilidades atribuídas unicamente à disciplina de Português.

Para Pozo e Crespo (2009), um dos objetivos dessa nova ‘cultura da aprendizagem’ é transformar os alunos em futuros cidadãos para que sejam aprendizes mais flexíveis, eficientes e autônomos, dotando-os de capacidades de aprendizagem e não apenas de saberes específicos, reduzidos à reprodução e/ou memorização conceitual.

Assim, podemos perceber que, atualmente, a Educação Científica não está arraigada apenas em descrições conceituais e/ou memorísticas, mas incorpora também conteúdos atitudinais e procedimentais. A atual cultura da aprendizagem requer uma articulação entre esses três conteúdos, entremeada por uma relação dialógica entre eles, atribuída a qualquer situação pedagógica, cujos objetivos de ensino e aprendizagem estejam bem delineados e definidos.

Em consonância com o delineamento do breve panorama relativo às conjunturas determinantes da Educação Científica contemporânea, Jiménez e Sanmartí (1997, p. 27) enumeram cinco metas ou finalidades factíveis de serem assumidas para ela:

a) Aprendizagem de conceitos e a construção de modelos;

b) O desenvolvimento de habilidades cognitivas e de raciocínio científico;

c) O desenvolvimento de habilidades experimentais e de resolução de problemas;

d) O desenvolvimento de atitudes e valores;

e) A construção de uma imagem da ciência.

Para Pozo e Crespo (2009), essas finalidades correspondem a três naturezas de conteúdos: conceituais, atitudinais e procedimentais, os quais deveriam estar presentes equitativamente nos objetivos da Educação Científica atual e na prática pedagógica. À revelia da importância dessa equivalência, a incidência desses três conteúdos, tanto no plano de aula do professor quanto na própria elaboração da avaliação, é acentuadamente distinta.

O currículo, mesmo que de forma não explícita, é balizado, sobretudo, em conteúdos conceituais: a aprendizagem em Ciências está centrada na aquisição teórica do corpus de conhecimento disciplinar, mesmo que, muitas vezes, essa aquisição seja reduzida a mera descrição/memorização de dados que são constatados apenas em especificações e contextos docimológicos.

Essa relevância atribuída ao conceito também caracteriza o discurso do professor, seja pela concepção acerca dos processos de ensino e aprendizagem, seja pelo que é cobrado nas avaliações. É comum o professor achar que seu aluno deve saber qual a fórmula de Bhaskara, quais as sinapomorfias do filo Cnidária ou o número de mol que caracteriza determinado elemento químico. No entanto, não dialoga com esse aluno sobre como atribuir significação ao conteúdo. Por exemplo: discutir, em termos evolutivos, como determinada sinapomorfia influenciou na fisiologia e morfologia característica do filo, ou ainda na distribuição e permanência (ou não) em ambientes com características abióticas distintas, ou quais características permitiram que uma espécie fosse cosmopolita. Fazer essas relações envolve aquisição de procedimentos: como estabelecer relações? Como fazer analogias? Como construir inferências?

Essas relações derivadas das especificações conceituais precisam ser discutidas durante as aulas, uma vez que não é papel do aluno, sozinho, reconhecer os desmembramentos do conceito abordado.

O mesmo acontece com os conteúdos atitudinais. Para muitos professores, dos três tipos de conteúdos que deveriam constar no currículo de Ciências para atingir as metas da Educação Científica, as atitudes são o mais difícil de abordar, uma vez que eles não estão preparados/dispostos a ensinar os alunos a comportarem-se durante a aula, a cooperar e ajudar seus colegas ou, inclusive, a descobrir o interesse pela ciência como forma de conhecer o mundo que nos rodeia (Pozo & Crespo, 2009).

O Ensino de Ciências deve estruturar-se em torno dos três conteúdos mencionados: conceituais, atitudinais e procedimentais. Nesse sentido, traçamos a importância da elaboração de um trabalho didático-pedagógico edificado a partir, também, de domínios epistêmicos ou habilidades do pensar, concebidos aqui como ponto de partida para trabalhos interdisciplinares.

Com o avanço da pesquisa em ensino e o surgimento de novas ideias, a interdisciplinaridade surgiu na década de 1980 como forma de aprimorar a concepção de Educação Científica (Ohira e Batista, 2005).

Sem a pretensão de reconstruir a história da Educação no Brasil, para entendermos as condições contextuais associadas a esse aprimoramento da concepção de Educação Científica, sustentado pelo pano de fundo da formação para cidadania, faz-se necessário recorrer a algumas generalizações características do processo de consolidação educacional no Brasil.

O sistema educacional brasileiro consolidou-se e (re)estruturou-se, na medida em que uma desarticulação clara entre a economia do país e os objetivos da educação tornava-se evidente. A Educação funcionava de acordo com predileções e configurações econômicas: mudava-se o eixo econômico do país, mudavam-se as principais atividades geradoras de mão de obra e, como consequência, mudava-se o perfil do trabalhador requerido. Uma vez mudado esse perfil, as exigências educacionais também mudavam e para que o profissional tivesse a formação exigida, fazia-se necessária uma reconfiguração nas bases e nos objetivos do sistema educacional (até 1930, período conhecido como República Velha, o Brasil era governado pela oligarquia cafeeira e, portanto, sua economia era regida pelo setor agrário exportador. Assim, não havia necessidade de alfabetização para o trabalho nas lavouras. Com a crise de 1929, e o início do processo de industrialização para atender o mercado interno, há um aumento das atividades relacionadas ao setor terciário e, portanto, há necessidade de trabalhadores mais qualificados. Após o golpe militar e a implementação das indústrias de base no país, a mão de obra necessária é ainda mais qualificada e iniciam-se as mobilizações para democratização do ensino e formação para cidadania. (Ribeiro, Costa, Ribeiro, & Benite, 2008).

Os objetivos educacionais são delineados a partir de questões conjunturais engendradas por questões de natureza múltipla (cultura, economia, política). A partir dessas reformulações, engendra-se uma plêiade de termos e jargões referentes a inovações didáticas, os quais incidem nos espaços escolares por meio de um discurso carregado de senso comum. A interdisciplinaridade emerge nesse contexto e, no entanto, distancia-se do ambiente escolar e de práticas escolares efetivas e exequíveis. Fala-se em um fazer interdisciplinar destituído de reflexões acerca da inserção desse fazer na sala de aula.

O saber interdisciplinar está amparado em uma formação a partir da qual as pessoas resolvam os problemas complexos da sociedade e sejam capazes de conectar os conhecimentos das Ciências/Tecnologia/Sociedade, dentre outros aspectos (Ohira & Batista, 2005). Abordaremos neste trabalho a relevância formativa subjacente aos desmembramentos de práticas pedagógicas interdisciplinares cujo foco seja a aquisição de determinadas habilidades do pensar com vistas à formação para cidadania.

Interdisciplinaridade e a aproximação do contexto escolar: que interdisciplinaridade fazemos?

O objetivo de Siqueira (2001) em seu trabalho foi o de articular a produção acadêmica e demais conhecimentos da área da Educação em Ciências com os propósitos de Formação Inicial e Continuada de professores. A autora discute sobre a falta de pesquisas ou ações pedagógicas que traduzam a incidência real das pesquisas na formação de professores. Dessa forma, além de compartilharmos esse dado, nos perguntamos: como tornar o discurso, ou a linguagem dessas pesquisas, próximo ao entendimento dos professores em atuação? Ou, como facilitar a realização, em ambientes escolares, das práticas pedagógicas descritas na literatura? Como transpor a barreira dos dissensos conceituais e planejar uma atividade didático-pedagógica que colabore efetivamente para o ensino e a aprendizagem? Como aproximar o que se faz no âmbito da pesquisa acadêmica da realidade escolar, de forma a fomentar a articulação entre subsídios teóricos e empíricos para os professores em atuação?

Siqueira (2001) indica a pequena quantidade de pesquisas relacionadas a programas ou projetos interdisciplinares realizados em contexto escolar, envolvendo as diferentes disciplinas do currículo. Para a autora, em um trabalho cuja metodologia fora um Estado da Arte sobre as pesquisas relativas ao tema interdisciplinaridade, embora o termo tenha sido muito discutido, principalmente em 1980, e depois de 1990, com a introdução dos PCN e dos temas transversais, os resultados dessas discussões ainda não alcançaram a sala de aula ou o contexto escolar de um modo geral.

Esse panorama evidencia-se quando a autora analisa as pesquisas e aponta a existência de uma confusão em relação ao que seja interdisciplinaridade. O termo ainda é entendido apenas como a integração das disciplinas do conteúdo escolar e não tal como propõe Fazenda (1979). O trabalho interdisciplinar promove a superação das fronteiras disciplinares por meio da criação de uma equipe interdisciplinar em que as atitudes dos membros, ainda que representem sua respectiva área do conhecimento, colabora para o enriquecimento do grupo. “Um trabalho interdisciplinar depende basicamente de uma atitude, ou de várias atitudes” (Fazenda, 1979, p. 39).

Mais do que pensarmos em caminhos para uma implementação prática referente ao que as pesquisas trazem sobre o termo interdisciplinaridade, nossos questionamentos fazem-se em torno da organização, do espaço e do tempo, característicos da escola média. Quais recursos pedagógicos, didáticos e estruturais estão disponíveis nela e auxiliariam ou atravancariam o trabalho interdisciplinar? Para que possamos prospectar ações interdisciplinares, necessariamente, precisamos partir de um currículo integrado? Precisamos encontrar convergências teóricas a respeito de um tema comum a disciplinas diferentes? Como, a partir de tantas compilações semânticas, propor uma atividade interdisciplinar sem subverter o sentido do termo?

A Interdisciplinaridade, quando analisada epistemologicamente, principalmente no que concerne à possibilidade de inserção no contexto de sala de aula, desmembra-se em três eixos: o curricular, o didático e o pedagógico. Embora esses três eixos estejam entremeados, há um foco maior, atribuído neste trabalho, à semântica pedagógica do termo, que a nossa reflexão tem o intuito de fornecer para fomentar a prática escolar relacionada ao modelo interdisciplinar. Como elaborar artifícios reais, a partir dos quais professores da escola pública possam iniciar um trabalho interdisciplinar ou coletivo?

A atualização da interdisciplinaridade no plano pedagógico requer, portanto, que se leve em conta um conjunto de dimensões próprias à dinâmica real da sala de aula, não somente uma teorização da prática interdisciplinar sobre o plano didático no seio de modelos ricos e coerentes; ela também necessita esclarecer que pode proporcionar uma análise curricular das possibilidades interdisciplinares oferecidas pelos programas em vigor (Lenoir, 1998, p. 59).

A partir da reflexão sobre as características da Educação Científica contemporânea, pensamos que a aquisição de habilidades do pensar, tratadas neste trabalho como domínios epistêmicos específicos, auxilia a formação do aluno como cidadão, de forma que ele saiba o que fazer com os conceitos e como abordá-los em contextos diferentes.

A aquisição de habilidades gerais permite ao aluno desenvolver um eixo comum de logicidade, o qual poderá contribuir em diferentes contextos escolares (em disciplinas de naturezas diferentes) ou situação cotidiana. Assim, enxergamos um caminho para auxiliar, embora não a partir de um currículo integrado específico, a formação para cidadania. As habilidades de dialogar, discutir, argumentar adquirem um sentido mais amplo dentro da perspectiva formativa escolar, uma vez que os conceitos adquiridos precisam ser mobilizados em contextos adequados e, portanto, inviabilizam a perspectiva memorística dos processos de ensino e aprendizagem.

Ao planejarmos uma ação interdisciplinar escolar, é necessário entender que esta é mais do que um sincretismo de concepções próprias de cada professor sustentado por objetivos coletivos, uma vez que o termo tem sido agregado a um modismo metodológico, uma inovação didática. Assim, o ‘fazer interdisciplinaridade’ reduz-se a um discurso retórico, carregado de etapas pedagógicas reducionistas, sem aportes teóricos que referenciem, de fato, uma articulação entre o trabalho interdisciplinar e as condições da escola atual (com seus limites e suas potencialidades).

De acordo com os dados obtidos por meio de um projeto desenvolvido de forma coletiva, abordaremos, neste artigo, a questão da interdisciplinaridade como uma ação educativa escolar consoante à adoção ou concepção de uma proposta de trabalho factível de ser implementada, a qual leva em consideração as condições atuais encontradas na Escola Média e, ainda, o dissenso sobre as interpretações do conceito de interdisciplinaridade encontrado na literatura - relativo tanto às bases epistemológicas quanto às implementações pedagógicas factuais (Lavaqui & Batista, 2007).

Os aspectos que diferenciam as práticas interdisciplinares, no âmbito científico e escolar, possibilitam uma reflexão acerca da exequibilidade de práticas pedagógicas, cujo objetivo é alcançar a perspectiva interdisciplinar, além de delinear características relevantes para a orientação da articulação de propostas de Formação Inicial de professores, de forma a atender algumas das demandas presentes no Ensino de Ciências, como uma prática que compreenda aspectos do processo de ensino e de aprendizagem no interior da ação educativa (Ohiro & Bastista, 2005).

A interdisciplinaridade teve, em um primeiro momento, preocupações que não se voltavam a sua aplicação escolar, fato ocorrido posteriormente com a difusão das concepções de interdisciplinaridade e a realização de estudos que visavam transpor a concepção de interdisciplinaridade desenvolvida no âmbito da pesquisa científica para a realidade escolar (Ohiro & Batista, 2005).

A complexidade dessas questões, como destacado por Lavaqui e Batista (2003), promove o debate em torno de uma Educação Científica que prepare os educandos para o exercício da cidadania, remetendo-nos novamente à reflexão em relação à adoção de práticas interdisciplinares no Ensino de Ciências e de Matemática. Algumas questões que orientam nossas reflexões são: Como promover a interdisciplinaridade no processo de ensino e de aprendizagem das ciências naturais e da matemática na Escola Média? Que modelo didático permite uma articulação interdisciplinar em diferentes contextos educativos? (Lavaqui & Batista, 2007).

A interdisciplinaridade aqui descrita intercepta aspectos práticos referentes à sala de aula, as necessidades formativas atuais e dialoga com o âmbito da pesquisa científica por meio de articulações exequíveis entre as pesquisas e o fazer pedagógico.

Este trabalho tratará sobre o uso de uma tabela para identificação (ou não) de habilidades epistêmicas específicas (discriminadas na tabela) nos alunos, após a realização das atividades propostas por cada professor. Trata-se de um recorte dos resultados oriundos de um projeto de melhoria do ensino público cujo eixo de fundamentação e elaboração foi a proposta de um trabalho interdisciplinar. O intuito foi investigar se a tabela elaborada facilitou o diálogo entre os professores e, como consequência, foi um artefato de mediação inicial para uma proposta pedagógica de natureza interdisciplinar.

Os domínios epistêmicos designados na tabela (linguagem e seus valores e habilidades cognitivas) são habilidades que facilitam o pensar lógico e deveriam ser objetivos de aprendizagem de qualquer disciplina. A questão ‘Como saber fazer o que fazer com os conceitos aprendidos em sala de aula?’ deve ser objeto de reflexão de todos os professores, uma vez que a logicidade do pensamento facilita a sua contextualização, além de colaborar para a formação para cidadania.

Para nós, o sentido epistemológico do termo interdisciplinaridade transpõe o diálogo entre as fronteiras disciplinares, uma vez que, por meio da ação pedagógica interdisciplinar, podemos aproximar os professores em torno de objetivos de aprendizagem comuns: a formação do pensar lógico do educando fomentada pela aquisição de habilidades epistêmicas.

Da memorização de conceitos ao pensar lógico: a importância da aquisição das habilidades do pensar

Inúmeras pesquisas demonstram que a maioria dos alunos não aprende a Ciência que lhes é ensinada. Além das dificuldades conceituais, os alunos encontram problemas com a construção de estratégias de raciocínio e solução de problemas próprios do trabalho científico (o que o aluno precisa aprender a fazer com os conhecimentos científicos). Em alguns casos, esses alunos não conseguem adquirir as habilidades necessárias, seja para elaborar um gráfico a partir de alguns dados ou para observar corretamente por meio de um microscópio, mas outras vezes o problema é que eles sabem fazer as coisas, mas não entendem o que estão a fazer e, portanto, não conseguem explicá-las nem aplicá-las a novas situações ou situações análogas (Pozo & Crespo, 2009).

Se nos limitarmos a repetir mecanicamente as ações será muito mais difícil recuperar o aprendido em qualquer situação em que se distancie minimamente da situação de aprendizagem e nos exija transferir o aprendido. Se os alunos treinam apenas para fazer exercícios (tarefas fechadas ou rotineiras para as quais já aprenderam uma solução específica), dificilmente aprenderão a resolver problemas (tarefas mais abertas para as quais é preciso buscar vias de solução) (Pozo, 2002, p. 230).

A ênfase na aprendizagem não implica buscarmos uma homogeneidade dos alunos, tampouco das disciplinas; ao contrário, por meio de atividades organizadas e contextualizadas, trata-se de incentivar os educandos à percepção de diferentes caminhos para resolver um problema, utilizando diferentes conhecimentos que se relacionam na busca de resoluções, valendo-se de criatividade e lançando um olhar crítico sobre as inúmeras referências do fenômeno estudado (Behrens, 2003).

Cabe aos professores propiciar “[...] atividades elaboradas buscando avaliar não a evocação de fatos, fórmulas ou dados, mas a capacidade de trabalhar o conhecimento” (Chassot, 1993, p. 39). Assim, há necessidade de transpor a barreira de aprendizagens por meio da transmissão de conhecimento para propor atividades em que se potencialize a significação dos conteúdos.

O grau de complexidade das relações estabelecidas a partir dos conceitos e seus significados desmembrados devem ser proporcionais às relações estabelecidas em sua compreensão. O papel essencial do Ensino de Ciências está, portanto, na construção do raciocínio lógico, sustentado pelas diversas formas sensórias, linguísticas e matemáticas. Dessa forma, concordamos com uma ação didática cujo objetivo é oferecer múltiplas possibilidades e habilidades para que novas significações sejam estabelecidas. Essa rede de significações pode ser tecida no que denominamos ‘Domínios Epistêmicos’ para construção do conhecimento em Ciências Naturais. É importante ressaltar que, embora esses domínios estejam classificados em três níveis - linguagens e seus valores, habilidades cognitivas e conceitos científicos - não há hierarquia preestabelecida entre eles.

Perrenoud (1998) reitera a necessidade de adquirirmos habilidades do pensamento, as quais permitirão a construção e concatenação de novos conhecimentos e em diferentes contextos. Assim, descreve que o aluno deve ‘aprender a aprender’ e ‘aprender a pensar’, de forma que tenha à sua disposição os instrumentos necessários para construir a si mesmo como pessoa e para aprender ao longo da vida (Bransford, Bown, & Cooking, 2000). Em consonância com o proposto pelo autor, e de acordo com os dados, podemos constatar que os professores se empenham em propor atividades as quais propiciem o desenvolvimento - por parte dos alunos - das habilidades referidas, e então, permita uma formação não apenas conceitual, mas que auxilie o aluno a construir um pensamento lógico e interpretativo, o qual será relevante não só para aquisição de novos conhecimentos científicos, mas também em situações cotidianas.

Para Lipman (1995), as pessoas já nascem com habilidades as quais permitem que pensem. Conforme o autor, embora todos pensem, nem todos pensam bem. Para o desenvolvimento do ‘pensar bem’, é necessária a estimulação por meio da educação escolar, das habilidades cognitivas de pensamento, alertando para o fato de que estas sempre ocorrem de forma integrada a cada contexto ou situação problemática em que são exigidas.

Embora essas habilidades cognitivas do pensamento sejam parte de uma reflexão epistemológica dos processos de ensino e aprendizagem, há necessidade de que elas incidam nas estratégias e (re)formulações didáticas. Para tanto, procuramos explorar essas relações a partir dos domínios epistêmicos, os quais podem nos fornecer indicadores de uma aprendizagem com estabelecimento de relações e construção de hipóteses, e não apenas memorização dos conceitos científicos. A aquisição de algumas habilidades em diferentes disciplinas pode indicar que o aluno foi capaz de transferir o conhecimento para outras situações/contextos (interpretar gráficos) ou ainda algumas formas de representação, estabelecimento de relações causais ou generalizações.

As principais habilidades discentes estimuladas a serem desenvolvidas são as seguintes: observar, descrever, identificar, comparar, coletar dados, experimentar, somar ideias, elaborar tabelas, gráficos, esquemas, sistematizar por meio de: textos, maquetes, relatórios, interpretar dados e relacionar. Adquirindo essas habilidades, os alunos podem mais facilmente estabelecer analogias, confrontos, associação entre fenômenos, mesmo que, a princípio, de forma não muito elaborada (Caldeira & Manechine, 2007).

A articulação entre essas habilidades e os conteúdos conceituais deveria ser a fundamentação basal das questões didáticas, uma vez que o aluno pode ancorar habilidades cognitivas adquiridas nos processos de ensino e aprendizagem aos mais diferentes contextos, sejam científico-escolares, ou cotidianos.

Essas habilidades do pensar, organizadas aqui por meio de duas categorias, habilidades de linguagem e seus valores e domínio cognitivo, subsidiam a construção de um objetivo comum de ensino e aprendizagem para disciplinas distintas, sob a perspectiva da formação para cidadania, do pensar lógico e da tomada de decisões.

Metodologia

A metodologia apresenta uma abordagem qualitativa ou naturalística de pesquisa (Lüdke & André, 1986). Um dos procedimentos sugeridos por tal abordagem é a análise documental, por meio da qual podemos recorrer a uma fonte estável e rica, além de poder ser consultada várias vezes e servir de base para diferentes estudos, o que garante uma maior estabilidade aos dados obtidos, além de estarem incluídos em um contexto.

O documento considerado nesta pesquisa são as tabelas preenchidas pelos professores de Física e Biologia com dados referentes à aquisição (ou não) de domínios epistêmicos pelos alunos participantes do projeto.

Além da análise documental, com objetivo de complementar os dados fornecidos pela tabela, realizamos uma entrevista com alguns professores participantes do projeto.

Para Lüdke & André, a entrevista representa um dos instrumentos básicos para coleta de dados quando estamos tratando de uma pesquisa de cunho qualitativo. No que concerne a esse instrumento de coleta, devemos nos atentar para o caráter de interação entre pesquisador e pesquisado estabelecido por ela, o que inviabiliza a hierarquia, em que há preponderância do pesquisador sobre o pesquisado, e evidencia a influência que um poderá exercer sobre o outro (Lüdke & André, 1986).

A vantagem da entrevista é que sua realização faz-se mediante um contexto, por meio do qual, de acordo com o estímulo e a aceitação mútuos, dados pela fluidez da conversa, pode-se fornecer ao pesquisador dados mais profundos, e ainda permitir o enfoque em determinados pontos. Além disso, pode atingir informantes que não poderiam ser atingidos por meio de outros instrumentos de coleta, como no caso de pessoas com pouca instrução formal, em que a aplicação de um questionário seria inviável (Lüdke & André, 1986).

Esse instrumento de coleta objetivou, uma vez que foi aplicado a professores que já haviam preenchido as tabelas de avaliação, obter dados complementares às tabelas.

A Tabela 1 foi organizada e construída a partir dos principais domínios epistêmicos do conhecimento, enumerados com base nas principais habilidades do pensar. A descrição detalhada de cada habilidade está em Caldeira (2005).

Tabela 1

Domínios Epistêmicos para a construção do conhecimento em Ciências Naturais

Como o trabalho interdisciplinar na escola pode contribuir para o processo de ensino

A escolha das tabelas como objeto comum de diagnóstico de aprendizagem para todos os professores participantes do projeto embasou-se, em um primeiro momento, em duas premissas principais: o tratamento de conteúdos procedimentais como fundamentais no processo de ensino-aprendizagem e a possibilidade de as tabelas favorecerem o trabalho coletivo entre os professores, uma vez que, para preenchê-las, os professores participantes do projeto conversariam entre si e elaborariam atividades cujo pano de fundo objetivasse as habilidades elencadas.

Dessa forma, pensamos que o uso dessas tabelas poderia ser um dos pontos iniciais para um trabalho interdisciplinar. Para fundamentar nosso raciocínio, recorremos à complexidade das questões contemporâneas e às exigências epistemológicas da ‘nova’ demanda de conhecimento. Além disso, o discurso de formação para cidadania exige do educando uma postura idiossincrática e argumentativa perante contextos socioeconômicos e outras questões do dia a dia. Os domínios designados na tabela como epistêmicos podem favorecer esse tipo de postura, uma vez que situam a Educação em Ciência em uma perspectiva contextual que ultrapasse o reducionismo da mera aquisição de conceitos científicos.

Análise e discussão dos dados

As tabelas

Uma vez que a proposta pedagógica a que nos referimos foi construída coletivamente pelos professores participantes do projeto, a apresentação dos dados será descrita com o intuito de elucidar como esses professores avaliaram a aprendizagem de seus alunos por meio da tabela, contendo domínios epistêmicos do conhecimento - de autoria da coordenadora do projeto, discutido e aceito por todos. Por meio das tabelas, objetivou-se verificar a aquisição das habilidades do pensar associadas ao desenvolvimento de linguagens e ao processo cognitivo, a partir das atividades realizadas em cada disciplina. Após a realização dessas atividades, os professores preenchiam essas tabelas, avaliando os domínios, adquiridos ou não, pelos alunos.

Os dados expostos, referentes aos 25 alunos, permitem que descrevamos algumas convergências relativas à forma como cada professor avaliou a capacidade dos estudantes em adquirir domínios de linguagem e de cognição diante do conteúdo específico abordado.

O primeiro apontamento é referente à forma como diferentes professores, responsáveis por diferentes disciplinas, avaliam o mesmo aluno.

Ao pontuar as habilidades adquiridas em cada domínio, tendo em vista que as tabelas foram preenchidas por diferentes professores - cada um preencheu a tabela referente às atividades desenvolvidas na sua disciplina -, fica nítida a discrepância entre as habilidades que os professores apontaram como adquiridas pelo mesmo aluno em diferentes disciplinas. Por exemplo, o aluno 2, segundo o professor de Biologia, adquiriu as habilidades de linguagem de ler e escrever, enquanto, para o professor de Física, o mesmo aluno lê, escreve, fala, participa de diálogo e interpreta. No que concerne às habilidades cognitivas, o aluno 2, em Biologia, coleta, relaciona e organiza dados, e, em Física, observa, estabelece relações causais, constitui hipóteses, relaciona e interpreta dados.

O aluno 9, em relação às habilidades de linguagem, tanto para o professor de Biologia quanto para o de Física, é capaz de ler e escrever. Já em relação ao domínio cognitivo, em Biologia, o aluno coleta, relaciona e organiza dados e não adquire habilidade alguma relativa a esse domínio em Física.

Ainda com relação aos dados fornecidos pela tabela, observamos que, se o aluno não tem as habilidades de ler e escrever, não desenvolve qualquer outra habilidade referente tanto ao domínio de linguagem quanto ao cognitivo. No entanto, quando essas habilidades basais são identificadas, o aluno é capaz de realizar habilidades mais complexas, como interpretar, relacionar, participar de diálogos.

As entrevistas

A entrevista aqui descrita foi realizada com dois professores: Biologia e Física. A escolha desses professores foi realizada pela presença e pelo envolvimento constante na realização das atividades referentes ao projeto. Sua estruturação é a que segue:

- O instrumento foi interessante para que você pudesse avaliar o processo de ensino e aprendizagem? Por quê?

- Ao observar os dados apresentados pela tabela, percebi que o mesmo aluno possuía muitas habilidades em uma disciplina e pouquíssimas em outra, ou seja, professores diferentes avaliaram o mesmo aluno de forma totalmente diferente. Como você justificaria essa questão?

- A participação no projeto, perfazendo todo processo de construção do material pedagógico até a sua aplicação, repercutiu de que forma na sua prática?

Por meio da entrevista, procuramos obter dados relativos à repercussão do projeto como um todo e inferências sobre ações potenciais para a construção efetiva de um projeto interdisciplinar. A tabela pode ser uma alternativa para propiciar a comunicação entre professores envolvidos, facilitando o trabalho coletivo e viabilizando tentativas de diálogos entre áreas diferentes, uma vez que as habilidades epistêmicas descritas nessa tabela são comuns a todas as disciplinas.

O tratamento dos dados obtidos será realizado por meio da apropriação do método de análise de conteúdo proposto por Bardin (1984).

Entendemos que o método de categorização pode esclarecer os pontos cruciais dos discursos dos professores participantes do projeto e, portanto, analisamos as respostas obtidas por meio da entrevista realizada com os professores de Física e de Biologia. Para tanto, nos apropriamos de um conjunto de técnicas de análise dos dados colhidos, visando a obter, por meio de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição dos conteúdos, indicadores relativos às condições e ao contexto de produção dessas respostas. Cabe ressaltar que as categorias foram construídas após realizarmos uma pré-análise dos materiais adquiridos.

Os professores serão designados pela inicial P (professor) e a inicial da matéria ministrada. Neste trabalho, dois professores de Física e um de Biologia foram escolhidos para análise, dada a participação e colaboração assídua no projeto, bem como sua disponibilidade para que a entrevista fosse realizada.

Em relação à primeira questão, as categorias estabelecidas foram:

C1: Reconhece a tabela como um instrumento fundamental para a estruturação de um trabalho coletivo.

C2: Reconhece a tabela como um instrumento que auxilia o professor no momento da avaliação, sem considerar a sua potencialidade para subsidiar propostas pedagógicas interdisciplinares ou formas coletivas de trabalho.

C3: Reconhece que o uso da tabela pode auxiliar a construção de propostas de trabalho coletivas.

De acordo com trechos específicos identificados nas respostas dos professores, podemos exemplificar cada categoria:

O PB não faz relações entre o uso da tabela e o contexto interdisciplinar e contextualizado em que o projeto se desenvolveu. Enquadra-se, portanto, na categoria 2, o que pode ser confirmado por meio do trecho:

Sim pois o uso das tabelas foi uma maneira de rever o processo de avaliação aplicado com os alunos até o momento, incluindo nesse processo aqueles conteúdos além dos conceituais, mas também os procedimentais e atitudinais. Além disso, possibilitou a realização de uma avaliação em etapas, considerando os processos de aquisição do saber pelo aluno, rompendo com o modelo finalista ao qual os professores estavam habituados (PB).

O PF1 (assim designado apenas para discernir do outro professor da mesma disciplina que também participou do projeto, sem referência à disciplina em si) reconhece a tabela como uma forma de unificar o processo e a avaliação, enquadrando-se na categoria 3. Essa assertiva pode ser constatada pelo seguinte trecho extraído da entrevista:

Sim, o instrumento é válido, uma vez que o mesmo unificou a forma de avaliação, já que todos os professores tiveram que se adequar as tabelas. [...] No entanto, faltaram algumas habilidades, especificamente voltadas para Física e Matemática. Faltou habilidades em que pudéssemos constatar que o aluno saia de um problema e generalizava (PF1).

O PF2 reconhece o uso da tabela como positivo, porém não menciona a relação desse instrumento com o trabalho coletivo entre os professores participantes do projeto. Assim, ele enquadra-se na categoria 2, o que pode ser verificado por meio dos trechos abaixo:

O uso da tabela foi positivo, uma vez que pôde perceber como e o que os alunos pensavam sobre um determinado fenômeno antes que qualquer conhecimento sistematizado lhes fosse transmitido. [...] Sempre buscando uma interação entre professor e alunos e entre os alunos, os alunos eram conduzidos a concepção científica sobre o fenômeno, construindo conceitos que davam suporte para o entendimento da situação física que lhes era apresentada (PF2).

Em relação à segunda questão, as categorias estabelecidas foram:

C1: Atribui as diferenças à epistemologia característica das disciplinas. Cada disciplina apresenta aspectos peculiares que tendem a explorar mais determinadas habilidades em detrimento de outras.

C2: Atribui a diferença à forma de cada professor elaborar e explorar as atividades propostas em sua disciplina.

O PB faz referência à especificidade que constrói e permeia a construção e as atividades de cada disciplina. Assim, enquadra-se na categoria 1, exemplificada a partir do seguinte trecho:

Atribuo essa diferença, primeiramente, aos processos de cada disciplina individualmente, uma vez que cada disciplina tem seus critérios próprios de construção de conhecimentos, assim como, habilidades com pesos diferentes, embora todos inter relacionados (PB).

O PF1 não cita as especificidades de cada disciplina, mas refere-se ao planejamento realizado pelo professor ao elaborar as atividades, o qual deveria estar vinculado a uma forma de avaliação, propiciando uma articulação coerente entre o que foi ministrado pelo professor e o que foi cobrado por ele em determinada avaliação. Enquadra-se, portanto, na categoria 2, como demonstra o seguinte trecho:

[...] aquele professor que não prepara a aula tem dificuldade em avaliar o aluno porque não sabe o que quer do mesmo; sendo muito complicado querer certo retorno daquilo que não forneceu (PF1).

O PF2 também atribui essa diferença à especificidade subjacente a cada disciplina, bem como ao interesse de cada aluno por determinada disciplina. Enquadra-se, portanto, na categoria 1, o que pode ser comprovado através do seguinte trecho:

Acredito que a especificidade de cada disciplina aliada a afinidade do aluno com uma determinada área pode fazer com que ele se desempenhe melhor numa área do que em outra (PF2).

Em relação à terceira questão, as categorias estabelecidas foram:

C1: Reconhece a repercussão positiva do projeto em relação à possibilidade de aprimoramento e reflexão sobre sua prática, mas não remete ao trabalho coletivo ou interdisciplinar.

C2: Reconhece a repercussão positiva do projeto em relação à possibilidade de aprimoramento e reflexão sobre sua prática, ressaltando que houve um trabalho interdisciplinar e coletivo.

C3: Reconhece a repercussão positiva do projeto em relação à possibilidade de aprimoramento e reflexão sobre sua prática, no entanto menciona que a interdisciplinaridade intencionada não pode ser construída.

A PB enquadra-se na categoria 2, como pode ser constatado a partir do trecho que segue:

As premissas do projeto já estavam de acordo com o que eu realizava em sala de aula, então considera mais relevante a participação coletiva dos professores, em uma mesma escola buscando um objetivo comum; essa forma de trabalho, além de ser formativa, pois garante o intercambio de conhecimentos entre os vários professores envolvidos, ainda garante uma visão mais global dos processos e fenômenos ensinados pelas diversas disciplinas (PB).

O PF1 enquadra-se na categoria 2, como ratifica o trecho seguinte:

O projeto tem relevância enquanto possibilidade de grupo de estudos de professores, e esses trabalhos coletivos deveriam ser realizados mais vez vezes. Foi muito bom o fato de todos os professores terem de se adequar ao mesmo tema, pois isso garantiu uma inter-relação entre os professores, e essa é uma forma de construir conhecimento. Era muito interessante quando nas reuniões um dos professores suscitava algo e dizia ah, o professor de História já havia dito isso (PF1,).

O PF2 enquadra-se na categoria 1, o que pode ser explicitado por meio do trecho abaixo:

O trabalho, minha pesquisa de doutorado mudou sim a prática no laboratório em que trabalho atualmente, pois, mesmo sabendo que o aluno já foi exposto a teoria, sabe, também, que provavelmente ele não entendeu muito bem, pois, provavelmente, aquele assunto não fez muito sentido a ele naquele momento (PF2).

O uso da tabela é uma forma de auxiliar o trabalho coletivo e o diálogo entre os professores envolvidos. A interdisciplinaridade pode ancorar-se na aquisição de habilidades epistêmicas. Por exemplo, ler e escrever são habilidades basais - como os próprios resultados da tabela indicam, uma vez que se o aluno não lê nem escreve, não é capaz de adquirir nenhuma outra habilidade descrita na tabela - cuja responsabilidade de ensino e aprendizagem não deve ser atribuída apenas à disciplina de Português. O aluno com dificuldades na leitura e escrita enfrentará dificuldades não só relacionadas ao Português, mas a todas as outras disciplinas.

As habilidades descritas auxiliam na construção de um pensar lógico, mobilizado não só no ambiente escolar, mas em diversos outros contextos, de diferentes naturezas. Assim, a contextualização deixa de relacionar-se unicamente aos conteúdos conceituais e passa a ser potencialmente considerada também a partir da aquisição de habilidades cognitivas.

Projetos como o descrito fornecem colaborações exequíveis para a realização de atividades interdisciplinares, uma vez que possibilitam o envolvimento do grupo. Discussões como tais acrescem dados empíricos para as pesquisas relativas à interdisciplinaridade escolar, aproximando a perspectiva acadêmica da escola, por meio de uma real incidência das pesquisas no contexto da sala de aula. Além disso, embora o termo interdisciplinaridade não seja um consenso na literatura, muitas pesquisas indicam que o entendimento da ação interdisciplinar incide em uma integração temática entre diferentes áreas, o que continua relevando apenas conteúdos conceituais.

A partir deste artigo, indicamos que o início de um trabalho que busque a interdisciplinaridade pode construir-se sobre os domínios epistêmicos, fomentado pela relação triádica entre habilidades do pensar, pensamento lógico e formação para cidadania.

Considerações finais

O planejamento de atividades didático-pedagógicas que objetivem a interdisciplinaridade deve pautar-se em bases epistemológicas mais complexas do que a escolha de um tema comum a ser trabalhado por professores de diferentes disciplinas. A falta, na literatura, de um consenso conceitual do termo interdisciplinaridade proporciona interpretações reducionistas e, muitas vezes, equivocadas do termo. A desarticulação entre as pesquisas publicadas e o que é exequível em uma escola de nível médio – tal como é apresentada atualmente - é um dos fatores que contribui para distanciar, cada vez mais, as pesquisas do que, de fato, pode ser entendido ou realizado por professores que atuam na escola pública.

A interdisciplinaridade está além da necessária integração dos conhecimentos das diferentes áreas. Qual a função dos conceitos se não pensamos no que fazer com esse conhecimento? De que forma o conhecimento engendrado nas salas de aula pode estar presente no dia a dia?

A aquisição de habilidades comuns a todas as disciplinas pode fornecer subsídios para o início de um trabalho coletivo e de uma aprendizagem mais lógica. Para Fazenda (1996), a interdisciplinaridade “[...] é uma relação de reciprocidade, de mutualidade, um regime de co-propriedade que iria possibilitar o diálogo entre os interessados” (Fazenda, 1979, p. 39). “Um trabalho interdisciplinar depende basicamente de uma atitude” (Fazenda, 1979, p. 39). Os dados discutidos neste trabalho indicam concordância com a definição proposta por Fazenda (1979) e apontam as tabelas como um caminho para iniciar a comunicação e o trabalho coletivo entre professores que se propõem a realizar ações interdisciplinares.

A partir das tabelas, o trabalho interdisciplinar pode ser um viés colaborativo para a formação da cidadania, uma vez que estaria priorizando não apenas a formação ‘conceitual’ do aluno. O contexto epistemológico do temo interdisciplinaridade (o qual obviamente irá refletir na sua perspectiva pedagógica) tem sido vinculado apenas à questão conceitual. Esse reducionismo não nos permite pensar em alternativas para a questão: ‘o que fazermos com os conceitos’, a qual incide em todas as disciplinas curriculares. O que fazer com conceitos pode ser respondido por meio de habilidades comuns às diferentes disciplinas, as quais facilitam as diversas modulações/configurações contextuais às quais um conceito pode estar submetido. Saber o que fazer com o conhecimento adquirido e como atribuir coerência a ele em determinado contexto e/ou situação é uma das vertentes para formação para cidadania.

Para os professores, a tabela permitiu a elaboração de atividades para aula com base nas habilidades descritas, bem como um olhar mais cauteloso para os alunos, procurando identificar determinadas habilidades. Dessa forma, uma vez que os professores de diferentes disciplinas tinham um objetivo de avaliação comum, eles passaram a dialogar entre si, esboçando idéias e possibilidades sobre um trabalho interdisciplinar.

Uma vez estabelecido o diálogo entre os professores envolvidos no projeto, bem como um objeto didático-pedagógico subsidiado pelos domínios epistêmicos, as tabelas podem ser apontadas como um dos caminhos iniciais para elaboração de um trabalho interdisciplinar, além de permitir uma reflexão, por parte dos professores, acerca dos conteúdos que devem ser trabalhados em sala de aula (além dos conceituais).

Como o trabalho interdisciplinar na escola pode contribuir para o processo de ensino

O principal objetivo da interdisciplinaridade é conferir ferramentas para enriquecer a visão de mundo dos alunos. A partir dessa abordagem, indivíduos de todas as idades compreendem que um mesmo fato ou tema pode ser observado e estudado a partir de diferentes pontos de vista.

Como a interdisciplinaridade em sala de aula contribui para o ensino?

Graças à interdisciplinaridade, além do engajamento com o processo de ensino-aprendizagem, é possível estimular as competências e habilidades necessárias para uma formação educacional sólida, incluindo aspectos não cognitivos.

Como a interdisciplinaridade pode contribuir para um aprendizado mais eficaz?

Aumenta a qualidade da aprendizagem Como a interdisciplinaridade proporciona um ensino contextualizado, a qualidade da aprendizagem aumenta. Afinal, os alunos ficam mais interessados pelas disciplinas quando entendem a utilidade do conteúdo programático.

Porque a educação interdisciplinar importante no processo de formação dos alunos?

Resumindo: a interdisciplinaridade na educação é importante porque engloba diversas habilidades que um estudante precisa desenvolver para atuar em diversas áreas da vida. Se parar para pensar, por exemplo, os problemas do mundo real são interdisciplinares.